segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Chimamanda Adichie: o perigo de uma única história

Nossas vidas, nossas culturas são compostas de muitas histórias sobrepostas. A escritora Chimamanda Adichie conta a história de como ela encontrou sua autêntica voz cultural - e adverte-nos que se ouvimos somente uma única história sobre uma outra pessoa ou país, corremos o risco de gerar grandes mal-entendidos.
buscado em: http://www.ted.com/talks/lang/por_pt/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html


Atuação do Serviço Social na Saúde Mental: entre os desafios e perspectivas para efetivação de uma política intersetorial, integral e resolutiva

POR: SULEIMA GOMES BREDOW  - Assistente Social; Mestre em Política Social pela Universidade Católica de Pelotas; Professora do Curso de Serviço Social do Centro Universitário Franciscano UNIFRA – Santa Maria – RS/Brasil. E-mail: sgbredow@yahoo.com.br ou sgbredow@unifra.br.
& GLÓRIA MARIA DRAVANZ - Assistente Social, formada pela Universidade Católica de Pelotas, Pelotas – RS/Brasil. E-mail: glorinhah88@yahoo.com.br

RESUMO – O presente artigo traz para discussão a prática profissional do serviço social na saúde mental, a partir da experiência de estágio curricular, desenvolvido no CAPS Escola, em Pelotas. Tem como objetivo demonstrar a importância da atuação em rede, como primeiro passo para o alcance de ações intersetoriais na saúde mental, a partir do processo de interlocução realizado no CAPS com as Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Destaca, ainda, o papel fundamental da ação profissional do assistente social na construção de uma rede de cuidados dirigida para a integralidade do atendimento, tendo como compromisso a autonomia e desenvolvimento da cidadania do usuário da Política de Saúde Mental. 
Palavras-chave – Saúde mental. Intersetorialidade. Integralidade. Ação profissional. 

coisas para ler, ver, ouvir e outros quetais!

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domingo, 30 de outubro de 2011

"A internação compulsória é sistema de isolamento social, não de tratamento"


Entrevista: Dartiu Xavier
Psiquiatra discute o tratamento para usuários de crack, a atuação do Estado junto a jovens usuários de drogas em situação de rua e a internação compulsória.

Por Gabriela Moncau A demonização do crack e uma suposta epidemia que estaria se espalhando pelo Brasil tem progressivamente tomado conta da imprensa e dos discursos dos políticos, como bem ilustrou a disputa eleitoral presidencial no final do ano passado. Assim, um imaginário social mais baseado em medo que em informações tem sido usado para justificar uma série de políticas polêmicas por parte do Estado no já questionável “combate ao crack”, normalmente amparado por forças repressivas. Desde o dia 30 de maio, a Secretaria Municipal de Assistência Social da Prefeitura do Rio de Janeiro tem colocado em prática o sistema de internação compulsória para crianças e adolescentes menores de idade usuários de crack em situação em rua. Os jovens são internados em abrigos onde são forçados a receber tratamento psiquiátrico. Atualmente, há cerca de 85 meninos e meninas que já foram recolhidos (contra a vontade) das ruas cariocas.

O modelo tem sido contestado por uma série de organizações sociais ligadas às áreas da assistência social, do direito, da luta antimanicomial, dos direitos humanos, entre outras, que veem na suposta defesa da saúde pública um disfarce para interesses econômicos e políticos ligados à higienização, especulação imobiliária e lobby de clínicas particulares. Em manifesto, a subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) acusa a Secretaria de Assistência Social do Rio de Janeiro de atuar como uma “agência de repressão, prestando-se à segregação e aumentando a apartação social que deveria reduzir, desconsiderando inclusive que o enfrentamento da fome é determinante no combate ao uso do crack, em especial da população de rua”. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) tampouco se mostrou satisfeito com a medida, que entende como inconstitucional. O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) classificou as ações como “práticas punitivas” e “higienistas”, em uma postura segregadora que nega o “direito à cidadania, em total desrespeito aos direitos arduamente conquistados na Constituição Federal, contemplados no Estatuto da Criança e do Adolescente – (ECA), no Sistema Único da Saúde – (SUS) e no Sistema Único da Assistência Social – (SUAS)”.

Respondendo à acusação de inconstitucionalidade, os defensores e idealizadores da medida atestam que na Lei 10.216, que trata de saúde mental, estão preconizados os três tipos de internação: voluntária, involuntária (sem o consentimento ou contra a vontade do paciente, com aval da família e laudo médico) e compulsória (com recomendação médica e imposição judicial). Já os que se posicionam contra alegam que, na prática, ao invés da ordem de internação compulsória ser impetrada por um juiz após análise de cada caso e com um laudo médico, ela está sendo determinada pelo Poder Executivo, de forma massificada e antes da adoção de outras medidas extra-hospitalares. O prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (ex- DEM, quase PSD) já afirmou que vê com bons olhos a ideia de implementar modelo semelhante na capital paulista, especialmente na região central da cidade, nas chamadas “cracolândias”. O Ministério Público já foi procurado pela prefeitura para assumir um posicionamento acerca da possibilidade, mas declarou que ainda está aguardando um projeto oficial impresso.

O Estado deve se fazer presente para esses jovens em situação de rua? Se sim, de que forma? O fato de serem menores de idade e/ou usuários de drogas lhes tira a capacidade de discernimento? É efetivo o tratamento feito contra a vontade do paciente? Que outros tipos de procedimentos podem ser adotados? No intuito de ajudar a responder essas e outras perguntas, a Caros Amigos conversou com o psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e diretor do Programa de Orientação e Assistência a Dependentes (PROAD), onde trabalha com dependentes químicos há 24 anos.

A internação compulsória não faz parte de nenhuma política pública, certo? Quando que esse dispositivo costuma ser usado? Não é só em casos específicos de possibilidade de risco da vida?

Sim. Todo uso de drogas pode trazer algum risco de vida, mas a internação compulsória é um dispositivo para ser usado quando existe um risco constatado de suicídio. A outra situação é quando existe um quadro mental associado do tipo psicose, seria quando a pessoa tem um julgamento falseado da realidade: se ela acha que está sendo perseguida por alienígenas ou se acredita que pode voar e resolve pular pela janela. Nessas situações de psicose ou um risco de suicídio é quando poderíamos lançar mão de uma internação involuntária.

Houve outros momentos da história em que a internação compulsória foi usada desse modo que está sendo implementado no Rio de Janeiro e prestes a ser em São Paulo?

Foi usada, principalmente, antes da luta antimanicomial. Tanto que existe até aquele filme, O bicho de sete cabeças, com o Rodrigo Santoro, que mostra os abusos que se faziam. No caso era um usuário de maconha que foi internado numa clínica psiquiátrica contra a sua vontade. Isso, hoje, é juridicamente uma coisa muito complicada, de modo geral não é mais aceito. Mas, infelizmente ainda acontece hoje em dia. Volta e meia sou chamado para atender alguém que foi internado compulsoriamente contra a vontade, sem citação de internação.

Para ler a entrevista completa e outras matérias confira edição de outubro da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.

Ensino a Distância rebaixa qualidade da educação no país


A maioria dos alunos que cursam essa modalidade de ensino é constituída por pessoas com baixo poder aquisitivo 

Por Lúcia Rodrigues 

Um em cada cinco estudantes universitários brasileiros está matriculado em cursos de Educação a distância (EAD) no país. A nova modalidade educacional surgiu no final da década de 1990, mas foi nos anos 2000 que esse formato de curso ganhou projeção.

O número de vagas oferecidas por empresas educacionais aumentou exponencialmente nesse período. Em 2000 eram 5.287 alunos matriculados em graduações a distância, em 2009 o total de universitários inscritos saltou para 838.125.

O último dado oficial sobre o número de alunos matriculados nesse tipo de formato é o do Censo da Educação Superior de 2009. Mas a rapidez com que os cursos de educação a distância se dinamizaram no país leva a crer que, hoje, a cifra já ultrapassou a casa de um milhão de estudantes matriculados em graduações oferecidas nessa modalidade.

Aparentemente democrática por ampliar o acesso à educação superior para um maior número de estudantes, a medida embute, na verdade, um forte componente ideológico. Cria no estudante a ilusão de que a qualificação garantirá o exercício pleno da profissão escolhida.

Mascara a ausência de políticas efetivas dos governos federal e estaduais para suprir em quantidade satisfatória a falta de vagas presenciais em instituições públicas do país. Escamoteia o problema central e desencadeia outro seríssimo ao facilitar o rebaixamento na qualidade do ensino dos cursos oferecidos a distância.

Na verdade, o ensino a distância foi o formato encontrado pelos governantes para diplomar pobres em massa e responder as metas educacionais impostas por organismos internacionais como o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio, a OMC.

Por isso, a garantia da qualidade dos cursos de graduação a distância não é a preocupação central desses dirigentes. Ao invés de investirem pesadamente na expansão de vagas em instituições públicas presenciais, enaltecem o “caráter democrático” desse modelo educacional que permite a um número expressivo de estudantes cursarem uma faculdade privada a distância.

“Conseguiram grudar a ideia de que o ensino a distância equivale à democratização do acesso. Além disso, rotulam quem questiona esse tipo de curso, como retrógrado”, ressalta César Augusto Minto, vice-presidente da Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo, a Adusp, e professor da Faculdade de Educação da USP, ao se referir à postura dos dirigentes governamentais e dos donos das empresas educacionais que disponibilizam graduações a distância. Segundo o docente, é difícil se contrapor a essa façanha ideológica que vendeu a ideia de que a democratização do ensino passa pela educação a distância.

Esses cursos foram introduzidos no país pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Mas a administração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva manteve a iniciativa e a ampliou. Em 2002, eram 40.714 matrículas; em 2006, o número havia pulado para 207.206, dois anos depois, em 2008, o total de estudantes matriculados chegou a 727.961. Embora se saiba que a administração da presidente Dilma Rousseff deu continuidade a essa medida, os números oficiais a respeito ainda não foram publicizados.

Péssima qualidade

O Censo da Educação Superior de 2009 aponta que, naquele ano, o Ministério da Educação reconhecia 844 cursos de graduação a distância no país distribuídos em 5.904 polos de apoio presencial. Duzentas e vinte e duas instituições estavam credenciadas junto ao MEC para oferecer cursos de Educação a distância. A maioria esmagadora dessas instituições é privada e está concentrada nas regiões sul e sudeste.

Os críticos do modelo consideram esse formato uma mina de ouro para os donos das faculdades, que conseguem aumentar ainda mais seus lucros. “Esses cursos têm forte teor mercadológico. Por isso, não se preocupam com a qualidade do ensino. As empresas tinham esgotado a capacidade de ampliar seus lucros e resolveram apostar nesse filão”, explica o dirigente da Adusp.

Esse tipo de curso permite o barateamento das mensalidades, porque consegue ampliar exponencialmente o número de alunos matriculados por turma, além de reduzir o total de professores. Os donos das faculdades também economizam com gastos de energia elétrica, água e funcionários, porque não há um campus para os estudantes frequentarem.

O curso é praticamente todo online. E o aprendizado é mediado basicamente pelo computador. Não há um espaço físico onde o estudante possa ir estudar, diariamente. A parte presencial do curso exigida pelo Ministério da Educação também ocorre de forma precária. Em algumas oportunidades definidas, o aluno se dirige a um local, chamado de polo, que a instituição disponibiliza para esses momentos presenciais. “Essa é uma forma capciosa, encontrada para dizer que o aluno tem aulas presenciais”, frisa o professor César.

Na atividade, o estudante continuará a não ter o contato direto com um professor. O docente leciona simultaneamente para milhares de estudantes espalhados em vários polos da instituição distribuídos pelo país, por meio de uma televisão ou de um telão instalados em uma sala. A Unip (Universidade Paulista), uma das maiores empresas privadas da área, tem mais de 100 polos no país, só na capital paulista são 20 locais.

O aluno não interage com o professor, só ouve as informações que são disseminadas na tela. Quem o acompanha presencialmente é um tutor que, na maioria dos casos, é aluno de pós-graduação, sem formação específica na área disciplinar que está sendo abordada na tela. As tutorias polivalentes respondem por várias matérias.

Os estudantes dos cursos a distância não têm como verbalizar suas dúvidas ao professor, nem mesmo intervir durante a explanação do docente. É o tutor quem faz a intermediação por meio da triagem de perguntas encaminhadas por escrito para o e-mail do professor que se encontra do outro lado da tela. Há casos em que apenas uma pergunta por polo é encaminhada ao docente. Não há tempo hábil para atender à demanda de questionamentos na hora. “O processo pedagógico é todo truncado. Uma pessoa fala em uma videoconferência, outra acompanha os alunos e outra fica responsável pelos trabalhos. Não há nenhuma articulação entre os vários segmentos. É uma situação de precariedade total, que só se justifica pela falta de preocupação com a qualidade do ensino”, enfatiza o dirigente da Adusp.

Para ler a matéria completa e outras matérias confira edição de outubro da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.

flecheira.libertária.224


mais que anunciada 
Mataram Gadaffi: a morte mais anunciada da temporada. As discussões na mídia giraram, então, sobre se ele foi executado pelos ditos “rebeldes” ou se foi ferido em fogo cruzado após sua captura. O fato é que o homem está morto. Que outro destino o esperava? A chamada “guerra ao terror” explicita que o extermínio é o que resta para terroristas e ditadores cujo prazo de validade — no apoio à grana capitalista e à ultrapassada geopolítica ocidental — acabou. Com Saddam Hussein ainda fez-se uma encenação de “justiça” que terminou na forca. Já com Osama Bin Laden deixou-se de lado o teatro humanista do tribunal. Gadaffi não era nada fora de sua farda de ditador.
efeito democrático
Aos tiranos não resta mais um asilo político em outro país. Isso passou a ser inaceitável depois que as práticas democráticas dos movimentos de contestação encurralaram os tiranos num buraco. Saddam Hussein se enfiou embaixo da terra; Gadaffi se refugiou em um duto. A imagem do poder dessa nova prática democrática é surpreendente: ela leva o tirano ao limite da fuga, que é refugiar-se numa cloaca, e expõe a imagem desses militantes democráticos... todos crêem no Estado. 
comida fria
Num canal estadunidense de notícias, o apresentador entrevistava um parente de alguém que morreu no atentado ao avião da Pan-Am, em 1986, patrocinado por Gadaffi. O repórter perguntou se o fato de Gadaffi ter sido morto sem julgamento o incomodava. A pessoa, então, gaguejando ligeiramente, fez um breve discurso sobre a nova liberdade que chegava aos líbios e, com um sorriso discreto no canto da boca, silenciou.mãos limpas, mãos sujas. 
Foi noticiado que Gadaffi, ao notar que o cerco se fechava, tentou escapar num comboio. Teria sido impedido por um bombardeio feito por drones (aviões não tripulados da OTAN). A ajuda vinda do céu permitiu que os “rebeldes” o alcançassem. Desfecho  exitoso para um dos novos modos de se guerrear: os ocidentais, com mísseis, satélites, aviões não tripulados, grana e apoio diplomático; os nativos, botando a mão na massa. Assim, fica tudo bem: não morre nenhum branco e um “novo” regime político — “batalhado” pelo próprio povo — substitui o que caducou, redimensionando o jogo para que os negócios continuem rolando. 
all right!
As refinarias de petróleo e gás natural funcionam a todo vapor. O novo governo já deu todas as garantias de que os suprimentos para a Europa serão normalizados e os contratos respeitados. Enquanto o povo buzina nas ruas, tremulando a nova (que, de fato, é a antiga) bandeira da Líbia, o fluxo de negócios se normaliza. E os europeus ficam tranquilos porque, para o frio inverno que vem por aí, o calorzinho já está garantido. Para os líbios, a Sharia.
preservacionismo banguela 
A coisa volta, de forma diversa. Agora é a vez dos cariocas protestarem contra a expansão do metrô e também contra os fluxos que o acompanham. Em defesa da tradição e da “natureza”, o Projeto de Segurança de Ipanema não quer a construção de uma estação do metrô na praça Nossa Senhora da Paz. Argumentam que a obra descaracterizará o local, tombado pela lei, além de trazer aspectos desfavoráveis como a derrubada de árvores centenárias e a retirada da área de lazer de idosos. Se em São Paulo o problema são as pessoas  diferenciadas vindas no pacote do metrô, no Rio a bandeira é o preservacionismo do cartão postal. Que coisa, boca banguela!
segredo nosso
Há 6 anos, o site  PostSecret publica cartões postais anônimos com segredos. Mais de 500 mil já enviaram suas confissões, que se tornaram públicas na internet. A partir de setembro, graças a um aplicativo, o confessionário tornou-se totalmente digital. O criador do PostSecret se empolga com a possibilidade que o aplicativo oferece para trabalhar estes dados, de fazer buscas neles e saber exatamente no que se diferem os segredos de gregos e troianos. 

Porque o SUS perde com os subsídios na saúde


 
"As Terapias Renais Substitutivas - TRS custaram ao SUS, no ano de 2010, R$ 1,6 bilhão. A hemodiálise é a TRS mais frequente e cobre 70 mil brasileiros. Assim, a TRS possui o maior orçamento dentre os procedimentos ambulatoriais de média e alta complexidade, crescendo sua quantidade ao longo dos anos. Porém, apenas 10,3% dos 18.780 equipamentos de hemodiálise pertencem ao Estado Brasileiro, cabendo ao setor privado, contratado pelo SUS, 83,3% desses equipamentos. Consequentemente, o SUS paga 95% do custo total", constatam Alexandre Marinho, pesquisador do Ipea e professor da UERJ e Carlos Octávio Ocké-Reis, pesquisador do Ipea, em artigo publicado no jornal Valor, 28-10-2011.

Eis o artigo.

Sistema Único de Saúde (SUS) é um modelo público universal, mas o perfil do nosso gasto público em saúde é parecido com o dos Estados Unidos, que é baseado em seguros de saúde privados. Por isso, o gasto público brasileiro em saúde é, em termos percentuais, menor do que o canadense e o australiano, que se destacam pela intervenção ativa do Estado.

No Brasil, considerando o baixo nível do gasto público, não surpreende que a despesa com planos de saúde tenha sido tão elevada - 23,7%) do total. Em particular, chama a atenção a proporção do desembolso das famílias com serviços médicos e medicamentos (29,2%), que ficou acima do caso americano em 2008, que foi de 12,1%

Estamos falando de sistemas diferentes, porém uma coisa parece comum a todos eles: a presença de subsídios - incentivos governamentais - que acabam patrocinando a rentabilidade do mercado de serviços de saúde e acabam socializando os custos da reprodução e manutenção da força de trabalho com os empregadores.

Então, considerando o gasto significativo das famílias mencionadas acima, duas opções, não exclusivas, estão colocadas para o governo federal: ou melhoramos a regulação dos preços de planos, medicamentos e serviços médicos para aumentar o bem-estar da população, ou melhoramos a qualidade dos gastos destinados ao mix público e privado para tornar o sistema de saúde mais eficiente (melhor alocação) e equitativo (melhor distribuição).

E para melhorarmos essa qualidade devemos perguntar se os incentivos governamentais favorecem o subfinanciamento do SUS e a privatização do sistema, incentivando as famílias a comprar planos de saúde. Resumindo, os subsídios voltados para promover o consumo prejudicam o setor público?

1- os prestadores de serviços médico-hospitalares são estimulados a trabalhar para o sistema privado, que é mais lucrativo, reduzindo a disponibilidade da oferta de serviços públicos;

2- apenas cerca de 30% dos servidores de nível superior trabalham em horário integral. Isso reduz o comprometimento com o SUS e dificulta o planejamento dos serviços de saúde;

3 - os prestadores médico-hospitalares não são incentivados a reduzir as longas filas de espera nos serviços públicos, dado seu interesse, consciente ou não, em aumentar a demanda por serviços privados;

4 - os subsídios para o setor privado acabam aumentando, de uma maneira descontrolada, a procura global por serviços de saúde, duplicando muitas vezes a oferta de serviços;

5 - os doentes idosos e crônicos são, na prática, expulsos do mercado, quando mais precisam, devido aos preços elevados dos prêmios dos planos de saúde, e têm de ser atendidos pelo setor público;

6 - os subsídios acabam determinando que os agentes privados - e não o governo - definam o montante total do gasto público em saúde;

7 - os receptores dos subsídios estão nos estratos superiores de renda, o que piora a regressividade tributária e o quadro de desiguladade em saúde no país.

A renúncia de arrecadação fiscal alcançou R$ 12,5 bilhões em 2006, magnitude equivalente a 30,6% do gasto público federal. Esse montante é superior aos R$ 7 bilhões, valor da estimativa de perda caso a regulamentação da Emenda Constitucional 29 fixe o gasto dos Estados com saúde com a exclusão do Fundeb.

A eliminação progressiva, ou o estabelecimento de um limite dos subsídios, parece uma alternativa crível para incremementar o financiamento do SUS. Vejamos o exemplo dos pacientes cominsuficiência renal crônica (IRC).

Existem duas terapias mais ou menos substitutas para IRC: a terapia renal substitutiva (TRS) e os transplantes de rim.

As TRS custaram ao SUS, no ano de 2010, R$ 1,6 bilhão. A hemodiálise é a TRS mais frequente e cobre 70 mil brasileiros. Assim, a TRS possui o maior orçamento dentre os procedimentos ambulatoriais de média e alta complexidade, crescendo sua quantidade ao longo dos anos. Porém, apenas 10,3% dos 18.780 equipamentos de hemodiálise pertencem ao Estado Brasileiro, cabendo ao setor privado, contratado pelo SUS, 83,3% desses equipamentos. Consequentemente, o SUS paga 95% do custo total.

As TRS podem, em grande medida, ser substituídas por transplantes de rim, que oferecem melhor qualidade de vida para os transplantados e melhor custo-efetividade para a sociedade. Por lei, os ditos planos de saúde novos não podem excluir os transplantes de rim dos procedimentos oferecidos nos planos com internação hospitalar, mas, no ano de 2010, o SUS financiou, sem ressarcimento, 95% do custo total dos transplantes de rim (R$ 90 milhões) e dos transplantes de órgãos sólidos (R$ 1 bilhão).


A rigor, as institutições privadas lucrativas contratadas pelo SUS não têm interesse em colocar seus pacientes nas listas de transplantes, apesar do tempo excessivo em diálise comprometer a saúde dos pacientes e o resultado dos transplantes. Pior: ano passado, os planos de saúde - favorecidos pela renúncia de arrecadação fiscal - tiveram um faturamento de R$ 72,7 bilhões e venderam planos para 25% da população brasileira, mas não financiaram mais do que 5% das TRS e 5% dos transplantes. Somados, TRS e transplantes de órgãos custam mais de R$ 2,6 bilhões ao SUS, anualmente.

Nesse quadro, a despeito dos recordes históricos de crescimento da demanda por planos de saúde, não vislumbramos a contrapartida de compartilhamento de custos do segmento privado subsidiado e financiado pelo SUS.
buscado em: http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=48842

As propostas da sociedade civil sobre os direitos da infância


 
" A violência social - nas suas diversas manifestações como conflito armado, criminalidade, violência institucional e de gênero, maus-tratos contra crianças e adolescentes - é um dos problemas mais graves que existe hoje na América Latina. As crianças e adolescentes constituem um dos grupos sociais mais afetados tanto pelas manifestações diretas como indiretas da violência".

A afirmação é de Cristiano Morsolin, operador de redes internacionais para a defesa dos direitos da criança na América Latina e co-fundador do Observatório Selvas.

Segundo Morsolin, será realizado em Genebra, nos dias 1 e 2 de novembro, uma Consulta de especialistas sobre a situação das crianças que trabalham e/ou que vivem nas ruas. Em seu texto, Morsolin traça algumas propostas da sociedade civil acerca desta problemática.

Eis o texto.

Drogas: legalizar é regulamentar


Exatamente como no caso do álcool e tabaco, política adequada para drogas hoje ilícitas é definir espaços e limites para seu uso — e não proibi-las
Por Júlio Delmanto
Assim como quando o governo paulista aprovou uma lei que proíbe o consumo de tabaco em ambientes fechados, com a aprovação da nova legislação que endurece a fiscalização e as multas aos estabelecimentos que vendem bebida alcoólica para menores de idade os antiproibicionistas se veem diante do questionamento: e agora? No momento em que estamos restringindo as drogas legais vocês querem legalizar as ilegais?
A resposta diante deste caso é simples, e é a mesma quanto ao caso do tabaco. Corretas ou não, não entremos no mérito neste momento: medidas como essas não são proibicionistas. Pelo contrário, elas caminham exatamente no mesmo sentido do que propomos. Afinal, legalizar as drogas hoje ilícitas não é nada mais do que regulamentá-las. A proibição é a ausência de qualquer tipo de regulamentação, deixando que o mercado ilegal — e invariavelmente violento — o faça.
O fim do proibicionismo representa exatamente novos marcos de controle social sobre as substâncias tornadas ilícitas há menos de cem anos. A história da humanidade está completamente imbricada com o uso de alteradores de consciência de distintas formas e tradições, e durante milênios o único controle exercido sobre elas era de ordem social, e não penal e médica, como atualmente. O que não quer dizer que não houvesse controle.
O caso do tabaco atualmente é emblemático. O governo coloca anúncios que dizem “morte”, “horror” ou “gangrena” nos maços, mas não proíbe venda e consumo. Ou seja, ao mesmo tempo em que admite que esta é uma substância cujo uso é prejudicial à saúde, o Estado afirma também que a única coisa que pode fazer é informar seus cidadãos sobre os riscos e impor algumas restrições aos fabricantes — como impostos altos e impedimento de publicidade — e aos consumidores — como a proibição do fumo em lugares fechados para não molestar os não fumantes.
Nem os mais reacionários defendem proibir álcool e tabaco de serem produzidos, vendidos e consumidos, com os agentes dessa cadeia sendo encarcerados e assassinados caso desobedeçam os novos marcos. Seria insano, exagerado, causaria muito mais danos, corrupção, mortes, encarceramento em massa e, além de tudo, são condutas que fazem parte da nossa cultura. É melhor controlá-las, investir na educação e na prevenção.
Por que não proceder desta forma em relação às substâncias ilícitas? Coerência e canja de galinha nunca fizeram mal a ninguém, e a nenhuma sociedade. Os antiproibicionistas não trabalham por nada além disso. Regulamentemos as drogas ilícitas, abramos um debate com a sociedade sob quais os melhores marcos para isso. Proibição da publicidade? Impedimento de acesso a menores de 18 ou 16 anos? Controle do uso em espaços públicos? Investimento pesado em educação e redução de danos? Parece mais sensato, não? E, claro, mais efetivo.

sábado, 29 de outubro de 2011

Breve debate sobre as Culturas de Periferia


Toró de Ideias from agenciasonhoazul on Vimeo.

Dois coletivos artísticos: “Fora de Frequência” e “A Banca” dialogam sobre educação, hip hop, poder público e protagonismo das periferias. Reflexões e anseios de quem vive militância perene
Num final de tarde gélido, dois coletivos (Fora de Frequência e A Banca) reúnem-se e iniciam uma conversa sobre cultura. Sem delongas, outros assuntos começam a ser abordados: educação, hip hop, poder público, falta de investimento e o protagonismo da cultura periférica.
O diálogo é informal e despretensioso. Entretanto, aborda questões que permeiam o cotidiano periférico desde a década de 90: falta de investimento em equipamentos públicos, estagnação da educação, a iniciativa de grupos de periferia, que adotaram a linguagem cultural como porta de saída (das mazelas) e entrada (para uma construção coletiva), e a visão interna/externa sobre a produção cultural nos bairros afastados do centro.

Cem homens e uma sentença


Vamos aos fatos: não importa quem é Letícia F. Nem mesmo importa o nome, que é um pseudônimo. Tampouco importa com quantos caras ela quer transar nesse ano. O que realmente importa nessa história toda é a sentença que lhe foi dada em um julgamento não requisitado: Letícia é uma puta.
Puta porque, desde fevereiro, tenta colocar em prática um projeto: transar com cem homens em um ano, relatando as experiências em seu blog. Quando chegou ao número 28 decidiu parar de postar relatos numerados. Mas foi alvejada pelo tal moralismo. O portal G1 a comparou à ex-garota de programa Bruna Surfistinha e a rádio Globo levou ao ar uma entrevista zombeteira com uma falsa Letícia. Além disso, ela recebe muitos emails e comentários em seu blog carregados de agressividade. Dá só olhada nos “melhores” aqui.
Com tudo isso, é de se perguntar: gozar de sua liberdade sexual é ser puta? Afinal, Letícia pode ter suas experiências e a blogosfera está aí tanto para ela narrá-las como para ser criticada. Mas porque a vida sexual de alguém ainda causa estardalhaço? Telefono para ela e vou direto na jugular da questão: por que toda essa polêmica?
“Porque as pessoas são hipócritas e conservadoras”, responde Letícia. E só. Um silêncio se instala na conversa e fico pensando nessas duas palavras.
Sobre ser mulher e ser puta
Hipócritas e conservadoras. Foi exatamente isso que ela disse. Faça um exercício de pensamento: qual é a imagem de mulher que, muitas vezes, nos é mostrada? Ela é constituída à imagem e semelhança da mãe. Assexuada, sem desejo próprio, santa, imaculada, que goza ao realizar o desejo dos outros.
Quase nunca nos é mostrada uma mulher senhora do seu desejo, que usa seu corpo como bem entende, anti-santa e que a meta de ser mãe fica no horizonte. Junte a isso a ideologia do amor romântico que é sempre associada à mulher e que reproduz o seu papel de dependente do homem e sem plena soberania de si. E, quando se substitui esse discurso pelo o do sexo, o resultado é semelhante às sentenças que Letícia costuma receber pelo seu blog.
Bom, a pesquisadora Larissa Pelúcio nos explica melhor como é feita essa construção social: “Mulheres não deveriam ser donas de seu corpo e muito menos de sua sexualidade. Aprendemos a nos constituir como mulheres em oposição à puta. E quando nos aproximamos dela, dessa mulher que tem autonomia (relativa) sobre seu sexo e se deita com muitos homens (e, talvez, mulheres também), isso nos torna menos mulheres, porque mais putas. Ameaçamos com nosso sexo a família canônica, os alicerces patriarcalistas da sociedade judaico-cristão”.
Sobre essa ameaça aos cânones, Letícia desenrola um pouco mais. “As pessoas tem uma vida sexual medíocre. Eu desconfiava já disso, mas é diferente de quando você recebe dezenas de emails, de homens e mulheres insatisfeitos sexualmente e, às vezes, por coisas muito pequenas, porque simplesmente não têm coragem de exercer sua sexualidade”.
E exercer plenamente suas vontades é algo que pode se transformar em um peso para Letícia. “Sempre as pessoas dizem que mudaram suas vidas, mas não posso ser responsável pela libertação dos outros, entende?”. Ela prossegue: “Sou responsável pela minha própria libertação e esse já é um fardo muito grande. Hoje é um dia que eu to me questionando muito se eu devo ou não continuar”.

Drogas: o proibicionismo nos movimentos sociais


Quem quer transformar o mundo deve reproduzir, em nome da eficácia, o controle sobre os corpos e as ações de disciplinamento praticadas pelo Estado ?
Por Júlio Delmanto
No último dia 15 de outubro, mais de 900 cidades de 82 países atenderam ao chamado proveninente dos “indignados” espanhóis e ocuparam praças e ruas demandando democracia real e o fim da ditadura financeira global. Em São Paulo, um movimento bastante plural se formou e decidiu montar um acampamento no Vale do Anhagabaú, a fim de dialogar com a população e estabelecer articulações internas que resultem em ações pautadas pelos consensos propostos no manifesto do movimento.
De sábado para cá, ao menos cem pessoas têm dormido diariamente debaixo do Viaduto do Chá, suportando chuva, frio e achaques da polícia — que não permite nem que barracas sejam levantadas — para levar suas demandas adiante. O modelo é de assembleia permanente. As decisões apenas são tomadas por consenso e sempre podem ser revogadas. Uma delas, creio que dialoga profundamente com nosso objetivo aqui — o de debater os diferentes aspectos políticos e sociais das “drogas”. Trata-se da proibição do uso de álcool no interior do movimento.
Foi uma decisão polêmica, e ainda carece de novos debates para ser, digamos, “ajustada”, já que o consenso não foi pleno, inclusive por parte deste que os escreve. Mas, a princípio, estabelece que o uso de “drogas” no interior do acampamento (que ainda não é um acampamento por conta do controle quase absoluto que o aparato estatal exerce sobre o cotidiano da cidade) está proibido. Entende-se como drogas, neste caso, o álcool e as substâncias ilícitas, e não a definição medicinal, que afirma: drogas são as substâncias que alteram o funcionamento dos organismos, resultando em mudanças comportamentais ou fisiológicas. Ou seja, partimos já de uma definição problemática do objeto. Maconha, cocaína e crack são drogas, mas também o são álcool, tabaco, medicamentos, café etc.
A proibição consensuada no que diz respeito ao uso de drogas ilícitas é mais facilmente defensável: seu porte e consumo sujeitaria o movimento à ação repressora policial. Isso traria consequências para o projeto político que se tenta implementar. Mas e quanto ao álcool, por exemplo? O que justifica que uma iniciativa de ativismo com fins de transformação social busque legislar sobre e reprimir a priori condutas individuais de seus membros? Por que um movimento social deve agir partindo de mistificações e com as mesmas premissas de disciplinamento e intervenção sobre os corpos com as quais trabalha o Estado a ser combatido?
Um dos argumentos — a meu ver o mais frágil, moralista e contraditório ao movimento em geral — é que poderia ser resumido como o espírito do “sacrifício militante” ou da “sobriedade ativista”. Não podemos estar drogados (música de terror ao fundo). Se queremos mudar o mundo, a droga (esse terrível ente dotado de vida própria) pode corroer nossos acordos e relações, pode nos levar à ruína na qual nunca cairíamos sem um ente externo e maligno.
Outro enfoque é mais consequente, mesmo que ainda questionável, e é trazido principalmente pelas feministas, que dizem que o uso de álcool acirra o comportamento violento masculino, cujo alvo invariavelmente são as mulheres. Assim como em Chiapas, no México, o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) proibiu consumo de álcool (o que não quer dizer que ele não ocorra) a partir de uma demanda das mulheres, a defesa é a de que o álcool gera violência, principalmente de gênero.
Drogas, um fetiche
Mais ou menos elaborados, creio que estes dois conjuntos de argumentos esbarram no mesmo equívoco: a fetichização das substâncias alteradoras de consciência, como se seus efeitos não variassem de acordo com seus usos. Assim como uma caneta pode escrever palavras de amor ou ser usada para perfurar uma jugular, uma substância, qualquer que seja, não detém vida própria, podendo servir tanto de veneno como de remédio, como o conceito de farmácon nos lembra.
Da mesma forma como o “combate ao crack” fetichiza a substância e convenientemente obscurece processos sociais muitos mais amplos — ou alguém defende que desaparecendo o crack a vida das populações de rua estaria melhor? —, a responsabilização de uma substância como o álcool como geradora de problemas como a violência de gênero serve apenas para que a questão não seja encarada com a seriedade e a profundidade que necessita, além de ser uma “fórmula mágica” que prima pela coerção e não pela solução dialogada, definida caso a caso, dos problemas concretos.
Certamente, em determinadas conjunturas o uso do álcool em determinadas formas — e novamente é preciso fugir das generalizações, e diferenciar por exemplo cachaça de vinho, cerveja de tequila, cada um tem sua história e cultura de uso — potencializa a violência. Mas é o álcool que a cria? Um homem que se dá o direito de agredir uma mulher quando alcoolizado deixará de submetê-la ao seu entendimento machista e opressor da realidade somente por estar “sóbrio”? Ou eleger o álcool como responsável pelo problema não serve simplesmente para evitar o debate de fundo, que deve questionar por que esse tipo de comportamento existe, mesmo no seio do movimento social?
E mesmo que sim, que fosse comprovada a conexão absoluta entre álcool e violência, a proibição resolve o problema? Não estamos partindo aí da mesma premissa proibicionista, a de que a repressão à oferta extingue a demanda? Uma solução impositiva como essa só tende a jogar o problema para baixo do tapete, uma vez que aquele que quiser realmente fazer uso dessas substâncias pode simplesmente fazê-lo em outros ambientes ou de forma escondida. Ou daremos consequênca a esta decisão e criaremos uma política absoluta de monitoramente e policiamento dos indivíduos?
Assim como é a lei que cria o crime, e a repressão seletiva (já que é impossível que um aparato repressor, por mais amplo que seja, consiga capturar todas as infrações cometidas) a este nunca ataca suas causas nem diminui sua incidência, a mera proibição de uma conduta que se vê como totalmente problemática, mesmo que o seja apenas parcialmente, só ataca os sintomas do problema, não os processos que o geraram. Além disso, novamente procedendo da mesma forma como o direito penal burguês, esta forma de resolução individualiza as condutas ofensivas, vendo nelas apenas responsabilidade individual e não suas determinações sociais.
Prefiro acreditar em uma alternativa que discuta as divergências caso a caso, que coloque os causadores de danos e as vítimas para dialogarem e para refletirem sobre os fatores sociais e coletivos que produziram a desavença. Pode ser mais difícil, assim como é dificílimo decidir tudo por consenso. Mas certamente é mais coerente com um projeto de fato libetário e questionador das premissas capitalistas não só da exploração como da dominação.

Profissão: artista

 Por Bruno Carmelo, editor do blog Discurso-Imagem.

Após filmar o balé de Paris e uma academia de boxe nos Estados Unidos, Crazy Horse(2011) é a terceira vez seguida em que o documentarista Frederick Wiseman se aventura pelas imagens de corpos, de treinos e de preparação física. Existe entretanto uma grande diferença entre o cabaré parisiense e as duas instituições anteriores: enquanto estas eram baseadas numa rotina de coreografias precisas e repetidas, Crazy Horse mergulha a câmera num verdadeiro caos “artístico”.
Isso porque o balé é baseado numa disciplina determinada, em movimentos conhecidos dentro de uma certa paleta. O mesmo vale para o boxe e sua coleção limitada de golpes e saltos. De certo modo, o diretor sabia onde poderia encontrar seus movimentos, e posicionava a câmera no ponto esperado. No entanto, no caso do “maior cabaré de nus do mundo”, como o Crazy Horse se autointitula, Wiseman fica visivelmente perdido: nada é preciso, o próprio local quer renovar suas apresentações, a noção de criação e de performance é diretamente confrontada ao caráter volúvel dos artistas presentes.
Em outras palavras, enquanto o balé e o boxe apareciam como “categorias profissionais” muito bem definidas, com rotinas e gestões enquadradas, a dança de nus pode ser determinada de diversas maneiras. O documentário flagra a época em que um grande coreógrafo, histriônico e arrogante como poucos, assume a direção de um novo espetáculo, Désirs (“Desejos”). É deste homem que vêm a maioria das pérolas desta “profissão artística”, ideia eternamente vaga entre os sociólogos, principalmente porque a maioria dos artistas recusa a perceber seu trabalho como uma profissão qualquer. “Desculpem, mais eu não posso ser genial todas as manhãs, eu dependo da inspiração”, ele diz, ou ainda “Eu atraso mesmo, não se pode impor uma data à criação, o que estamos fazendo aqui é arte!”.
Ou seja, a arte pode vir e voltar, aparecer e sumir, estando sempre submetida às sensações e à boa vontade do coreógrafo. Apesar de seu evidente conhecimento técnico de dança, seus julgamentos e escolhas parecem todos baseados na emoção, na percepção não justificada: “Acho que ainda falta alguma coisa”, “Talvez a luz azul traga algo a mais a este número”. Diante da incapacidade de contestar (afinal, como se argumentar logicamente com quem não usa a lógica?), as meninas obedecem, e os produtores empurram a data do lançamento, preocupados entretanto em tornar o espetáculo o mais rentável possível.
Enquanto Wiseman filma centenas de seios, bundas, contorcionismos, sombras e reflexos de toda a natureza, o espetáculo vai se criando, tentando conceder às sensibilidades de todos os envolvidos. O mais interessante é ver o tal coreógrafo protestar quando descobre que os técnicos do local não possuem hierarquia entre eles, trabalhando de modo comunitário. “Mas se algo dá errado, a quem eu posso reclamar?”, ele protesta. Esta é uma das cenas mais clássicas no que se diz respeito à ideia de profissão, de hierarquia e de poder envolvida no trabalho artístico.
Wiseman filma as disputas de poder com o mesmo fascínio que mostra as curvas femininas, enquanto o tal desejo se torna cada vez mais distante quando dissecado desta maneira, revelando cada peça de seu mecanismo interno, sem fetiche nem idealização. Muitos críticos reclamaram que Crazy Horse é um filme muito menos preciso do que os antecedentes – em especial a toda-poderosa Cahiers du Cinéma. Talvez isso represente a surpresa real deste diretor, metódico e tranquilo, diante do caos de egos imensos, luzes, seios, brilhantes, sexos, de um excesso muito kitsch e que se leva a sério até demais.
Crazy Horse (2011)
Filme franco-americano dirigido por Frederick Wiseman.