sexta-feira, 30 de abril de 2010

Contos Desbotados

SAGU COM VINHO*
Era uma hora da manhã quando começou a pensar naquelas coisas, mas tinha a nítida sensação de que pensava naquilo há muito tempo. Primeiro perdeu o sono no exato instante em que se preparava para dormir. Depois sentiu fome. Uma fome desesperadora. Queria comer tudo o que viesse a sua frente, e ao mesmo tempo não conseguia situar nada que pudesse acabar com aquilo.
Na verdade não era fome, mas uma vontade incontrolável de comer alguma que pudesse aplacar aquela ansiedade. Pensou que talvez estivesse ressuscitando o seu já superado alcoolismo. Buscou a garrafa de vinagre e cheirou, mas não sentiu nenhum barato. Procurou, alucinada, a garrafa de álcool, aspirou profundamente, mas também não deu nada. Vasculhou umas bebidas guardadas e pescou uma garrafa de vinho, tinto, seco, bem ao seu gosto (diga-se, de passagem, seu antigo gosto), sacou a rolha e deixou para sentir na taça o aroma daquela bebida aveludada. Quase entrou em êxtase, mas não sentiu nem vontade, nem necessidade de beber. Mas teve certeza de que tinha a ver com vinho aquele seu desejo indecifrável.
Já amanhecia quando abriu mais uma vez a geladeira –que estava abarrotada- e repassou tudo o que havia ali dentro. Por sorte nada provocou a sua compulsão. Nada do que ali estava serviria para aplacar sua imensa necessidade de preencher aquele vazio, aquele buracão que se abriu num repente em seu imaginário, e que parecia, mesmo, que era um buraco aberto em seu próprio corpo/ em seu corpo real.
Não lembrava como havia começado aquele desespero. Pensou em procurar um grupo de apoio. Um grupo de auto-ajuda que pudesse dar conta daquele seu desespero. Mas como haveria de procurar um grupo se não sabia ao menos de que é que se tratava aquele seu estado. Até pegou a Lista Telefônica e se pôs a procurar um psicólogo, um psicanalista ou um psiquiatra que pudesse lhe ajudar... um daqueles que já anunciam na publicidade quais são os problemas subjetivos que atendem e tratam (obesidade, alcoolismo, depressão, ansiedade, compulsão, tristeza mórbida, etc., etc.), mas deixou a lista de lado, porque não sabia do que é que se tratava o seu problema.
Foi procurar outras coisas para fazer, ocupou-se e acabou esquecendo, adormecido, aquele monstro que já de manhãzinha, antes do dia clarear, havia despertado dentro dela. Naquele dia receberia visitas para o almoço. O companheiro retornaria mais cedo porque se comprometera em preparar alguma coisa para a sobremesa, pois os amigos que viriam para o almoço não conseguiam apreciar com tranqüilidade a refeição principal se não tivessem a certeza da iminência do doce e do café passado em coador de pano.
Quando ele chegou, avisou que havia trazido vinho e sagu. Faria sagu com vinho, que rendia mais. Quando ouviu isso, seu corpo se transformou, sua cabeça rodopiou e ela teve a sensação de que havia encontrado o que tanto procurava. Sagu com vinho. Ficou contente por estar com os preparativos para o almoço já adiantados, assim poderia acompanhá-lo na preparação do sagu com vinho. E fez isso em estado de êxtase, já pensando na degustação daquela massa gelatinosa, suspirando com a mistura do aroma do vinho com o cravo e a canela. Depois aguardou, ansiosamente, o momento de comer o doce.
Almoçou pouco, que era para deixar espaço para o que viria depois. Serviu a primeira porção e foi comer sozinha nos fundos da casa, para que ninguém percebesse o que é que se passava com ela. Comeu devagarzinho, sentindo cada porção que colocava na boca. Quando concluiu, já estava mais calma e retornou à mesa com aquela expressão de saciedade, mas ainda serviu tantas vezes pôde, daquilo que podia preencher o seu vazio.
Passado o almoço, começou a sentir necessidade de comer sagu com vinho. No começo o companheiro atendia ao seu pedido de que preparasse o doce, pensando que fosse um desejo bobo, talvez vermes (poderia ser uma solitária autoritária e devoradora), ou talvez uma gravidez ainda não constatada, mas depois percebeu que ultrapassava todos os limites de normalidade. Tinha que comer sagu durante a noite (acordava até três vezes para comer sagu com vinho durante a noite). Tinha que comer sagu com vinho no café da manhã. No lanche das dez. No almoço. No café da tarde. No jantar. Antes de dormir. Nos intervalos entre essas refeições. E ele, que não gostava lá tanto assim de sagu com vinho, às vezes, para acompanhar, tomava uma taça de vinho, às vezes duas, às vezes a garrafa inteira.
Chegou um momento em que sua vida se tornara sagu com vinho. O companheiro já estava assustado... se ele não preparava o doce, ela dava um jeito de conseguir que alguém o fizesse, até que um dia decidiu ter uma conversa séria com ela. Ou se tratava daquele estado de sagu com vinho, ou não teriam mais como manterem o relacionamento.
Ela decidiu que como não teria como encontrar um grupo de auto-ajuda que pudesse lhe auxiliar na superação de seu estado sagu com vinho, montaria o seu próprio grupo. Chamaria alguns profissionais que pudessem dar um suporte técnico ao grupo e depois chamaria para a participação todos aqueles que sofressem por sagu com vinho ou por outra compulsão assemelhada. Sagu com leite. Ou raspa de arroz. Ou pele de galinha. Ou sorvete. Ou café doce. Ou leite condensado. Ou charutinho de chocolate. Ou salada de batata com maionese. Ou tantas outras coisas.
Enfim, nunca descobriu o que é que provocava aquele vazio imenso, mas já estava conseguindo, por mais vinte e quatro horas, passar sem sagu com vinho.
* Escrito publicado no Jornal Estilo - Cruz Alta/RS, em tempos idos.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

PROGRAMAÇÂO do FSEA - Panambi/RS

ATENÇÃO PARA A PROGRAMAÇÂO DO Fórum Social, Econômico e Ambiental – FSEA 2010 - Responsabilidade e Compromisso de Todos.



Acesse e participe: www.fsea.com.br

PROGRAMAÇÃO FSEA 2010
ABERTURA DO EVENTO: Sexta-feira - Dia 14/05 – Horário: 08:00
- Banda e Pronunciamento das autoridades presentes.
- Visitação aos expositores da FEAP 2010, em seguida abertura dos painéis de debates.
Painel 01 - Sexta-feira - Dia 14/05 – Horário: 09:30 às 12:00 hrs
Tema: SUSTENTABILIDADE GLOBAL - UM NOVO PARADIGMA
1- Prof. Daniel Rubens Cenci (Dr. em Meio Ambiente e Desenvolvimento/UFPR - Mestre em Direito - Professor da UNIJUI - DEJ (Depart. de Estudos Jurídicos))
2- MS Economista Fábio Roberto Moraes Lemes (Unijui/Itecsol)
3- Prof. M.Sc. Enedina Maria Teixeira da Silva (Mestre em Engenharia da Produção/UFSM - Professora da UNICRUZ)
4- Prof. Dr. Jorge O. Cuéllar Noguera (Dr. Eng de produção/UFSC – Coord. Curso pós graduação ambiental/ UFSM)
Intervalo: Almoço – 12:00 às 13:50 hrs
Painel 02 - Sexta-feira - Dia 14/05 – Horário: 14:00 às 17:30 hrs
Tema: RESGATE DA FAMÍLIA COMO BASE DA SOCIEDADE MODERNA
1- Prof. MS Jorge Alexandre da Silva (Coordenador da Itecsol - Unijui/Itedcsol)
2- Prof. Elizabeth Fontoura Dorneles (Dra. em letras/UFRGS - Reitora da UNICRUZ)
3- M. Sc. Maria Luiza Diello (Mestre em Filosofia/UFSM - Psicóloga da Secretaria Municipal de Saúde de Cruz Alta)
4- Rose Therezinha Kummel (Mestre em educação/PUC/RS – Licenc. plena em letras e literatura/UPF – diretora da sec. Munic. de habitação, trabalho e ação social de Panambi – RS)
5- Marinei Aguiar Aimi (Mestre em geografia – Coord. Pedagógica 36º CRE/RS)
Painel 03 - Sábado - Dia 15/05 – Horário: 08:30 às 12:00 hrs
Tema: O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL SUSTENTÁVEL
1- Luis Carlos Heinze (Deputado Federal e agropecuarista)
2- Prof. Adriano A. Saquet (Prof. Dr. Ciências Agrárias/Alemanha)
3- Prof. Antonio Carlos Valdiero (Pró-Reitor UNIJUÍ/Campus Panambi, Avaliador ad hoc do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais - INEP/MEC, Engenheiro Mecânico pela UFRJ, Mestre e Doutor pela UFSC)
4- Alexandre Batista Scheifler (Assessor de política agrícola e meio ambiente/FETAG RS)
Intervalo: Almoço – 12:00 às 13:50 hrs
Painel 04 - Sábado - Dia 15/05 – Horário: 14:00 às 18:00 hrs
Tema: PASSANDO PELO PRISMA DA ECOLOGIA
1- Prof. Francesca Werner Ferreira (Dra. em Zootecnia, Produção Animal, Piscicultura pela UFSM - Representante da UNIJUI no Forum da Agenda 21 de Ijui e no Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Ijui - Professora da UNIJUÍ - DBQ (Dep de Biologia e Química))
2- Dr. Marcos Eduardo Rauber (Promotor de Justiça e defensor do meio ambiente)
3- Diego da Silva Coimbra (Eng. Agrônomo - Membro da diret. da assoc. Ijuiense de prot. ao ambiente Natural – AIPAN) - (desistência)
4- Dr. João Paulo Bittencourt (Promotor de Justiça e defensor do meio ambiente)
5- Eng. Ivo Lessa Silveira Filho (Eng. Agrôn. - Consultor téc. da Farsul na área ambiental e de rec. hidricos)
6- Eng. Almir J. Rebelo de Oliveira (Eng. Agrôn. e presidente clube amigos da terra de Tupanciretã-RS)
Trabalhos pós último painél
Sábado - Dia 15/05 – Horário: 18:00 às 18:30 hrs
- Definição do Cronograma de elaboração do documento de sugestões de políticas públicas nas áreas sociais, econômicas e ambientais e envio para esferas governamentais, ONG`s, Imprensa e outros;
- Encerramento do Fórum Social, Econômico e Ambiental – FSEA 2010.
ENCERRAMENTO FSEA 2010
FEIRA DE ECONOMIA SOLIDÁRIA, AGRICULTURA FAMILIAR E PEQUENAS EMPRESAS – FEAP 2010
Sexta-feira - Dia 14/05 - Abertura para os Expositores às 6:00 hrs
– Abertura para o Público às 9:00 hrs
– Fechamento para o público às 20:00 hrs
– Após as 20:00 hrs haverá apresentação musical com bandas locais gospel e tradicionais, valor do ingresso 01 kg de alimento não perecivel ou o valor de R$5,00 - (cinco reais)
Sábado - Dia 15/05 – Abertura para os Expositores às 7:00 hrs
– Abertura para o Público às 8:00 hrs
– Fechamento para o público às 20:00 hrs
– Após as 20:00 hrs haverá apresentação musical com bandas locais gospel e tradicionais, valor do ingresso 01 kg de alimento não perecivel ou o valor de R$5,00 - (cinco reais)
Domingo - Dia 16/05 - Abertura para os Expositores às 7:00 hrs
– Abertura para o Público às 8:00 hrs
– Fechamento para o público às 20:00 hrs
ENCERRAMENTO DA FEAP 2010

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Clarice: Um vislumbre do fim

Ainda Clarice, dos extratos colhidos por Pedro Karp Vasquez.
Um vislumbre do fim “Uma vez eu irei. Uma vez irei sozinha, sem minha alma dessa vez. O espírito, eu o terei entregue à família e aos amigos com recomendações. Não será difícil cuidar dele, exige pouco, às vezes se alimenta com jornais mesmo. Não será difícil levá-lo ao cinema, quando se vai. Minha alma eu a deixarei, qualquer animal a abrigará: serão férias em outra paisagem, olhando através de qualquer janela dita da alma, qualquer janela de olhos de gato ou de cão. De tigre, eu preferiria. Meu corpo, esse serei obrigada a levar. Mas dir-lhe-ei antes: vem comigo, como única valise, segue-me como um cão. E irei à frente, sozinha, finalmente cega para os erros do mundo, até que talvez encontre no ar algum bólide que me rebente. Não é a violência que eu procuro, mas uma força ainda não classificada mas que nem por isso deixará de existir no mínimo silêncio que se locomove. Nesse instante há muito que o sangue já terá desaparecido. Não sei como explicar que, sem alma, sem espírito, e um corpo morto — serei ainda eu, horrivelmente esperta. Mas dois e dois são quatro e isso é o contrário de uma solução, é beco sem saída, puro problema enrodilhado em si. Para voltar de ‘dois e dois são quatro’ é preciso voltar, fingir saudade, encontrar o espírito entregue aos amigos, e dizer: como você engordou! Satisfeita até o gargalo pelos seres que mais amo. Estou morrendo meu espírito, sinto isso, sinto...”

terça-feira, 27 de abril de 2010

Clarice: Viver e escrever

Por esses dias, mais um pouco de Clarice, dos extratos de Pedro Karp Vasquez.
Viver e escrever - “Quando comecei a escrever, que desejava eu atingir? Queria escrever alguma coisa que fosse tranqüila e sem modas, alguma coisa como a lembrança de um alto monumento que parece mais alto porque é lembrança. Mas queria, de passagem, ter realmente tocado no monumento. Sinceramente não sei o que simbolizava para mim a palavra monumento. E terminei escrevendo coisas inteiramente diferentes.”
“Não sei mais escrever, perdi o jeito. Mas já vi muita coisa no mundo. Uma delas, e não das menos dolorosas, é ter visto bocas se abrirem para dizer ou talvez apenas balbuciar, e simplesmente não conseguirem. Então eu quereria às vezes dizer o que elas não puderam falar. Não sei mais escrever, porém o fato literário tornou-se aos poucos tão desimportante para mim que não saber escrever talvez seja exatamente o que me salvará da literatura.
O que é que se tornou importante para mim? No entanto, o que quer que seja, é através da literatura que poderá talvez se manifestar.”
“Até hoje eu por assim dizer não sabia que se pode não escrever. Gradualmente, gradualmente até que de repente a descoberta tímida: quem sabe, também eu já poderia não escrever. Como é infinitamente mais ambicioso. É quase inalcançável”.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Clarice: A descoberta do amor

Ando escrevendo pouco, não por falta de papel, mas por falta de tempo físico... mas sigo com o projeto de ir largando aos poucos do trabalho... isso não significa que não gosto do que faço, mas meu ofício me exige e me toma... poderia me tomar bem menos!
Quando vejo até as paredes escorrendo a saudade da mulher amada... quando vejo seu retrato querendo falar, querendo me dizer alguma coisa... quando seu travesseiro me enlaça e me conforta... olho os raios de sua luz que atravessa minha existência e saio quieta no escuro, pra enxergar melhor a lua-rainha de uma monarquia que só a poesia preserva!
Ando lendo Clarice. Leio desde a adolescência, as suas letras, mas nunca prestei atenção na pessoa de Clarice. Agora que estou lendo uma Biografia sua, escrita por Benjamin Moser (norte-americano!!!), intitulada CLARICE, tenho retomado umas coisas suas e dessas, arranco de uma seleta feita por Pedro Karp Vasquez, um extrato de A descoberta do amor - “[...] Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em apreender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce, estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo, aliás, atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.
Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. [...] Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza. Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez.
Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amor. [...] Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continuou intacto. Embora eu saiba que de uma planta brota uma flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é por pudor apenas feminino. Pois juro que a vida é bonita.”

domingo, 25 de abril de 2010

DIVULGAÇÃO: Simpósio "Direitos Humanos e violência, governo e governança"

V Simpósio da Cátedra Unesco–Unisinos
Direitos Humanos e violência, governo e governança
Tema: Direito à justiça, reparação, memória e verdade.
A condição humana nos estados de exceção
“O que se oculta pelo esquecimento, voltará a repetir-se pela impunidade”
O V Simpósio da Cátedra Unesco- Unisinos de Direitos Humanos e violência, governo e governança tem como tema Direito à justiça, reparação, memória e verdade. A condição humana nos estados de exceção. Os contextos de exceção se impõem para obter o pleno controle da vida humana, em especial daqueles grupos considerados socialmente perigosos. Na exceção, o direito é suspenso e a vida se torna vulnerável, arbitrando sobre ela uma espécie de vontade soberana que rege seu destino. A violência dos estados de exceção tende a se ocultar sob o manto do esquecimento. Contudo, a violência histórica só pode ser neutralizada pela memória do acontecido. Este simpósio pretende debater o III Plano Nacional de Direitos Humanos, assim como a pertinência da criação de uma Comissão Nacional de verdade e Reparação. A memória, para além de qualquer revanchismo, pretende neutralizar o potencial mimético que toda violência esconde, e sem a qual a sociedade brasileira tenderá a perpetuar a barbárie como parte da sua normalidade social.
Comissão coordenadora: Castor M.M. Bartolomé Ruiz (PPG Filosofia, Unisinos)/ Cecília Pires (PPG Filosofia, Unisinos)/ José Carlos Moreira da Silva Filho (PPG Ciências Criminais – PUCRS)/ Fernanda Bragatto (PPG- Direito, Unisinos)/ Solon Viola (PPG-Ciências Sociais, Unisinos)
Data: 17 a 20/5/2010
Local: Auditório Pe. Bruno Hames (área de Ciências Jurídicas), Unisinos
Inscrição: Central de Relacionamento Unisinos (vale 20 horas para atividades complementares)
Investimento: R$ 10,00
Organizadores: Cátedra Unesco Unisinos de Direitos Humanos e violência, governo e governança, PPG em Filosofia Unisinos e curso de Graduação em Ciências Sociais, Direito e Filosofia Unisinos
Patrocínio: CAPES- PROCAD
Apoio: Núcleo de Direitos Humanos/ Grupo de Pesquisa Ética, bioética e alteridade, Unisinos/ Grupo de Pesquisa Direito à Verdade e à Memória e Justiça de Transição, PUCRS/ NEFIPO (Núcleo de Estudos de Filosofia Política)
Programação:
17/5
19h30 - Abertura
Inauguração da Exposição Fotográfica da SEDH na Unisinos: “Direito à Memória e à Verdade”
- Reitor Pe. Marcelo de Aquino/ Castor Bartolomé Ruiz (coordenador da Cátedra Unesco-Unisinos de Direitos Humanos e violência, governo e governança)/ José Luis Bolzan de Moraes (coordenador do PPG Direito – Unisinos)/ Adriano Naves de Brito (coordenador do PPG-Filosofia, Unisinos)/ André Callegari (coordenador Curso Direito)
20h - Tema: O III Plano Nacional de Direitos Humanos e a comissão da verdade no Brasil
Conferencistas: Paulo Vannuchi (Secretário Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República)/ Paulo Abrão (Presidente da Comissão Nacional de Anistia)/ Coordenador-debatedor: José Carlos Moreira da Silva Filho (PPG Ciências Criminais – PUCRS)
18/5
17h - Filme - Batismo de Sangue
Debatedor: André Luiz Olivier da Silva
20h - Tema: A condição humana nos estados de exceção
Conferencistas: Márcio Seligmann-Silva - UNICAMP/ Bethania Assi– PUC-Rio/ Coordenadora-debatedora: Cecília Pires (PPG-Filosofia, Unisinos)
19/5
17h - Filme “Memória para Uso Diário”
Debatedoras: Beth Formaggini e Ana Miranda
20h - Tema. justiça de transição e julgamentos por violação de direitos humanos
Conferencistas: Ivan Marx (Procurador Regional da República no Rio Grande do Sul)/ Luciana Garcia (Advogada da Justiça Global e Conselheira da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça)/  Coordenadora-debatedora: Fernanda Bragatto (PPG-Direito, Unisinos)
20/5
17h - Filme “Condor”
Debatedores: Roberto Mader e Jair Krischke
20h - Tema. As lutas da sociedade civil pelo direito à justiça, reparação, memória e verdade
Conferencistas: José Maria Gomes PUC-Rio/ Giuseppe Tosi – (UFPB)/ Coordenador-debatedor: Solon Viola (PPG Ciências Sociais, Unisinos)

A Vida dos Homens Infames

Trago essas palavras e logo mais as de Foucault, para pincelar o tom de algumas questões que vem ocupando meus pensamentos, sobre o que, falarei mais noutra postagem.
Começo, então, com palavras de Jünger, citadas por Sabato para capinar a entrada de seu livro A Resistência: “São os expulsos, os proscritos, os ultrajados, os despojados de sua pátria e de seu torrão, os empurrados com brutalidade aos mais profundos abismos. É entre eles que se encontram os catecúmenos de hoje”.
Para quem se interessa pelo pensamento de Foucault, trago um recorte de A Vida dos Homens Infames, que é um artigo publicado em 1977, a partir da exumação dos arquivos do Hospital Geral e da Bastilha, quando começa a tecer a curvatura da dobra em seu pensamento, no liame entre a questão do poder e os primeiros feixes de luz sobre a subjetivação. É um de seus textos mais belos, em que diz: “Este não é um livro de história (...). É uma antologia de existências. Vidas de algumas linhas ou de algumas páginas, desventuras e aventuras sem nome, juntadas em um punhado de palavras. Vidas breves, encontradas por acaso em livros e documentos (...) Vidas singulares, tornadas, por não sei quais acasos, estranhos poemas, eis o que eu quis juntar em uma espécie de herbário (...). Se eu o fiz então é sem dúvida por causa dessa vibração que sinto ainda hoje, quando me ocorre encontrar essas vidas ínfimas que se tornaram cinzas nas poucas frases que as abateram (...). Não é uma compilação de retratos (...): são armadilhas, armas, gritos, gestos, atitudes, astúcias, intrigas cujas palavras foram os instrumentos. Vidas reais foram ‘desempenhadas’ nestas poucas frases; não quero dizer com isso que elas ali foram figuradas, mas que, de fato, sua liberdade, sua infelicidade, com freqüência sua morte, em todo caso seu destino foram, ali, ao menos em parte, decididos. Esses discursos realmente atravessaram vidas; essas existências foram efetivamente riscadas e perdidas nessas palavras (...). Para que alguma coisa delas chegue até nós, foi preciso, no entanto, que um feixe de luz, ao menos por um instante, viesse iluminá-las. Luz que vem de outro lugar”. O escrito, na íntegra, pode ser encontrado no Volume IV, de Ditos e Escritos (Edição brasileira - Pgs. 203-222).

sábado, 24 de abril de 2010

Brevíssimo Conto

PINHÃO - Passando em corrida pela feira, ouviu o Velho, exaltado em seu machismo, pronunciar contra a moça da banca do pinhão: “pois saiba a senhora que PINHÃO é macho!”. Chegou a ouvir a palavra PINHÃO em letras de forma. Estacou em seu passito rápido, pensando em se meter na discussão, mas a moça retrucou: “pois fique o senhor sabendo que o PINHÃO (ela também pronunciou a palavra em letras de forma) vem da pinha da araucária fêmea. Veja que isso não é pouco! E da pinha do pinheiro, meu senhor, não sai nada, só serve pra enfeite... o que já é bastante!”. Deu as costas para a conversa e saiu a pensar se as caturritas moravam nas araucárias fêmeas ou nos pinheiros... quis perguntar para elas, alguma coisa sobre essas questões de gênero das plantas que lhes servem de morada!

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Poetagens Alheias - De Bachelard

Vindas de Bachelard: “Quem já não viu em algumas linhas que aparecem num teto o mapa de um novo continente? O poeta sabe tudo isso. Mas para dizer à sua maneira o que são esses universos criados pelo acaso nos confins de um desenho ou de um devaneio, ele vai habitá-los. Encontra um canto onde viver nesse mundo do teto desenhado”.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Gabriela Silva Leite - Prostituta

uma entrevista com Gabriela Silva Leite, socióloga e prostituta, "Diretora da ONG Davida conta sua trajetória como prostituta e relembra um pouco da história da prostituição feminina no Brasil entre os anos 60 e 70".
E em outro vídeo, http://revistatpm.uol.com.br/tv-tpm/sou-puta-sim.html, mais algumas palavras de Gabriela:

terça-feira, 20 de abril de 2010

DIVULGAÇÃO: Ciclo de Estudos Filosofias da diferença - Pré-evento do XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana

Atenção, pessoas! Aí vai a Programação do "Ciclo de Estudos Filosofias da diferença - Pré-evento do XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana"
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_eventos&Itemid=19&task=detalhe&id=182

Realização - Início: 04 de maio de 2010 - Término: 23 de junho de 2010 - Horário: das 19h30min às 22h
Duração: 18h - Local: Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros - Instituto Humanitas Unisinos - IHU - Av. Unisinos, 950 - Bairro Cristo Rei - São Leopoldo
Objetivo Geral - Possibilitar a compreensão e a reflexão do tema central do XI Simpósio Internacional IHU O (des)governo biopolítico da vida humana, visando debater e refletir sobre a vida humana como objeto do poder e recurso útil nas estratégias biopolíticas das sociedades contemporâneas.
Específicos
1. Esclarecer as bases conceituais subjacentes à problemática biopolítica;
2. Debater as diversas formas como o humano é resignificado de forma instrumental pelos dispositivos de poder nas nossas sociedades;
3. Analisar as categorias filosóficas que possibilitam á vida humana se “insurgir” como referencial ético-político;
4. Refletir sobre as categorias filosóficas que desenham as possibilidades e limites do humano e o pós-humano face às novas tecnologias.
Público-alvo - Professores(as), pesquisadores(as), estudantes universitários(as) e comunidade em geral.
Programação*
04 de maio - Freud e o inconsciente - Prof. Dr. Mário Fleig – Unisinos
11 de maio - A crítica de Heidegger ao biologismo de Nietzshe e a questão da biopolítica - Prof. Dr. Ernildo Stein - PUC-RS
24 de maio - Nietzsche e o pensamento trágico - Prof. Dr. Oswaldo Giacoia – Unicamp
26 de maio - Benjamin e o pensamento alegórico - Profa. Dra. Cláudia Castro – PUC-Rio
01 de junho - Foucault e a questão do sujeito - Prof. Dr. Alfredo Veiga-Neto - Unisinos
09 de junho - A geografia deleuziana do pensamento - Prof. Dr. Roberto Machado - UFRJ
17 de junho - Derrida e o pensamento da desconstrução - Prof. Dr. Paulo Cesar Duque Estrada – PUC-Rio
23 de junho - Lévinas e o pensamento do outro - Prof. Dr. Castor Bartolomé Ruiz – Unisinos
*Sujeito a alterações
Investimento
Evento todo: Profissionais - R$40,00 / Estudantes em geral - R$20,00
Por palestra: Profissionais - R$8,00 / Estudantes em geral - R$5,00

NOVA DIVULGAÇÃO: XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana

XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_eventos&Itemid=19&task=detalhe&id=181
Apresentação - A Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, sob a coordenação do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, e apoio dos Programas de Pós Graduação em Ciências Sociais, Educação, Direito, Filosofia e Saúde Coletiva, promove o XI Simpósio Internacional IHU: O (des)governo biopolítico da vida humana, a ser realizado entre os dias 13 e 16 de setembro de 2010, em São Leopoldo – RS.
Realização
Início: 13 de setembro de 2010 - Término: 16 de setembro de 2010 - Duração: 40h
Local: Anfiteatro Pe. Werner - Unisinos - Av. Unisinos, 950 – São Leopoldo/RS
Objetivo geral - Promover um debate transdisciplinar sobre a vida humana como objeto do poder e recurso útil nas estratégias biopolíticas das sociedades contemporâneas.
Objetivos específicos
- Propiciar uma análise filosófica dos modos de captura da vida humana pelos dispositivos de poder;
- Discutir os modos biopolíticos da redução da vida humana à mera “vida nua” e seus impactos em relação ao trabalho e a (re)produção da vida;
- Mostrar as relações cada vez mais complexas e estreitas entre a medicina social e a governamentalidade biopolítica;
- Analisar as relações da vida humana com o Direito nos processos de normalização dos sujeitos;
- Debater a relação entre as várias formas de exceção jurídica e a captura biopolítica da vida humana;
- Refletir sobre as implicações biopolíticas inerentes à bioética.
Público-alvo - Professores(as), pesquisadores(as), estudantes universitários(as) e comunidade em geral.
Programação*
13 de setembro
10h – Início do credenciamento – Anfiteatro Pe. Werner
14h às 16h30min – Conferências simultâneas
1. Judicialização da saúde no Brasil – Prof. Dr. Paulo Gilberto Cogo Leivas – Ministério Público – RS
2. O testemunho na era biopolítica: reflexões sobre violência e a vida nua – Prof. Dr. Márcio Seligmann–Silva – Unicamp
3. A constituição da subjetividade na contemporaneidade
17h30min – Abertura oficial
18h às 19h30min – O direito dos governados – Prof. Dr. Frédéric Gros – Université Paris – Est Créteil Val de Marne – França
19h30min às 20h30min – Debate
14 de setembro
8h30min – Recepção
8h45min às 10h – Biopoder e pós–humanismo – Prof. Dr. Oswaldo Giacóia – Unicamp
10h às 10h30min – Debate
10h30min às 10h45min – Intervalo
10h45min às 12h – Temporalidade capitalista, exploração da vida humana e tempo messiânico – Prof. Dr. José Antonio Zamora – Consejo Superior de Investigaciones Científicas (CSIC) – Espanha
12h às 12h30min – Debate
14h30min às 16h30min – Conferências simultâneas
1. A exceção inscrita nas forças de segurança do Estado: impasses e desafios da segurança pública no Brasil – Prof. Dr. Roberto Armando Ramos de Aguiar – UniCEUB
2. Justiça de Transição na América Latina: a importância dos julgamentos por violações de Direitos Humanos para o fortalecimento das instituições democráticas – Prof. Dr. Louis Bickford – New York University (NYU) – Estados Unidos
3. A biopolítica e a normalização dos sujeitos – Prof. Dr. Francisco Ortega – UERJ
17h às 18h30min – Comunicações
19h às 19h45min – Apresentação de pôsteres
20h às 21h15min – Mobilização Jurídica e Transnacional na defesa dos Direitos Humanos: estratégias de combate às violações de Direitos Humanos no Brasil – Profa. Dra. Cecília MacDowell Santos – University of San Francisco (USF) – Estados Unidos
21h15min às 22h – Debate
15 de setembro
8h30min – Recepção
8h45min às 10h – A financeirização como forma de biopoder – Prof. Dr. Andréa Fumagalli – Università degli Studi di Pavia – Itália
10h às 10h30min – Debate
10h30min às 10h45min – Intervalo
10h45min às 12h – Entre Deuses e Césares: a laicização e as novas configurações do poder na sociedade contemporânea – Prof. Dr. Fernando Catroga – Universidade de Coimbra (UC) – Portugal
12h às 12h30min – Debate
14h30min às 16h30min – Minicursos Simultâneos
1. Biopolítica em Michael Foucault e Giorgio Agamben, duas perspectivas – Prof. Dr. Selvino Assmann – UFSC
2. O biopoder e a governamentalidade dos sujeitos – Prof. Dr. Cesar Candiotto – PUCPR
3. Bioética, Saúde e Corpo – Profa. Dra. Paula Sandrine Machado – UFRGS
4. Pensar a crise do capitalismo Global na perspectiva do devir–Brasil do Mundo – Prof. Dr. Giuseppe Cocco – UFRJ
5. O surgimento das ciências da vida – Profa. Dra. Vera Portocarrero – UERJ
6. Biopoder e as nanotecnologias – Prof. Dr. Wilson Engelmann – Unisinos
7. Dever de memória e violência do esquecimento: anistia e transição democrática no Brasil – Prof. Dr. José Carlos Moreira da Silva – PUCRS
8. Governamentalidade e Educação: a Modernidade como uma Sociedade Educadora – Prof. Dr. Carlos Ernesto Noguera – Universidad Pedagógica Nacional (UPN) – Colômbia
9. As tecnologias nos processos educativos e a sujeição do indivíduo – Profa. Dra. Karla Saraiva – ULBRA
10. É possível uma medicina do homem? – Prof. Dr. Roberto Passos Nogueira – IPEA
17h30min às 18h30min – Lançamento de livros
18h30min às 19h45min – Confraternização
20h às 21h15min – Biotecnologias, ciências da vida e produção de subjetividade na sociedade contemporânea – Profa. Dra. Paula Sibilia – UFF
21h15min às 22h – Debate
16 de setembro
8h30min – Recepção
8h45min às 10h – O poder e a vida nua, uma leitura biopolítica de Agamben – Prof. Dr. Edgardo Castro – Escuela de Humanidades – Argentina
10h às 10h30min – Debate
10h30min às 10h45min – Intervalo
10h45min às 12h – A Jurisdição Penal Transnacional como instrumento da justiça transicional: solução ou problema na defesa dos Direitos Humanos? – Profa. Dra. Deisy de Lima Freitas Ventura – USP
12h às 12h30min – Debate
14h às 16h30min – Minicursos Simultâneos
1. O juí¬zo absoluto e a paralisia da linguagem: a pura violência e a vida nua – Prof. Dr. Ricardo Timm de Souza – PUCRS
2. Biopolítica, corpo e politização da experiência da doença – Prof. Mauro Cabral – Universidad Nacional de Córdoba (UNC) – Argentina
3. Agenciamentos biopolíticos e direito à saúde – Prof. Dr. José Roque Junges – Unisinos
4. A exceção jurídica na biopolítica moderna – Prof. Dr. Castor Bartolomé Ruiz – Unisinos
5. A vontade antropotécnica: a teologia política cristã e o nascimento da ordem biopolítica moderna – Prof. Dr. Fabián Ludueña – Universidad de Buenos Aires (UBA) – Argentina
6. Gênero, Tecnologia e Biopolítica: sobre as modificações corporais do sexo na transexualidade – Profa. Dra. Márcia Arán – UERJ
7. Biopoder e dispositivos de normalização – Prof. Dr. Alfredo Veiga-Neto – Unisinos
8. Empreendedorismo, concorrência e educação: faces da governamentalidade neoliberal e da biopolítica contemporânea – Prof. Dr. Sylvio Gadelha da Costa – UFC
9. Inclusão e Biopolítica – Profa. Dra. Maura Corsini Lopes e grupo – Unisinos
17h30min às 18h45min – Poder e secularização: as novas dimensões do poder e os Direitos Humanos – Prof. Dr. Giacomo Marramao – Università di Roma Tre (Uniroma3) – Itália
18h45min às 19h30min – Debate
19h30h às 20h – Encerramento
*Sujeito a alterações
Investimento - Aguarde informações.

domingo, 18 de abril de 2010

Brevíssimos Contos - Amando uma Porta

Um dia amei uma porta. Precisei de algo que estivesse sempre fechado, batendo em meu nariz. Amei essa porta, como nunca amei ninguém. E noutro dia, depois de tanto quebrar o nariz, fechei-a para sempre. Passei a querer amar uma abertura. Mesmo que na língua dos engenheiros e arquitetos, porta e abertura possam ser a mesma coisa, passei a querer amar uma abertura!

sábado, 17 de abril de 2010

Contos Desbotados

UMA FORMIGA* - Por um hábito bobo de correr os olhos e o olhar pela calcinha quando ia ao banheiro, deparou-se, naquela tarde quente de domingo, assim que sentou no vaso sanitário, com uma formiguinha que andava lentamente pelo forro de algodão macio e confortável que tem por função proteger os lábios inferiores de mazelas do meio externo, e logo ali encontrava-se a formiguinha.
Estava lá a formiguinha, tão tranqüila que parecia andar no carreirinho que faz caminho entre o alimento colhido e o formigueiro; pequenina, tranqüila e serena, apenas extraviada da correição.
Retardou suas ocupações sanitárias pensando que não haveria lugar mais insólito para encontrar uma formiga; pensou em contar para os amigos sobre o inusitado encontro, mas recuou quando entendeu que talvez pudessem não acreditar, ou que transformariam suas partes pudendas em engraçadas histórias -e o receio não se dava pelas ditas partes, mas pela pobre formiguinha; esqueceu da possibilidade de divulgação e pôs-se a tentar entender como é que chegara e o que é que fizera permanecer ali aquela formiga.
Pensou nas mais diversas possibilidades: no lugar úmido e aquecido; no açúcar presente em sua urina diabética; no doce de abóbora que comera em abundância, misturado ao leite morno; nos desejos secretos daquele ser tão pequenininho; que talvez não fosse somente uma e as demais formiguinhas já tivessem adentrado aquela caverna vulcânica que tantas lavas expele quando entra em erupção; no mel que poderia estar atraindo aquelas doceiras.
Recordou de uma situação vivida na infância, em que tentava acordar no meio da noite porque tinha a sensação de que sua cama estivesse tomada por formigas; era inverno e deixou-se dominar pela preguiça de despertar, mas a força da realidade que estava acontecendo fez com que acordasse e corresse acender a lâmpada e chamar sua mãe, quando, com pavor, constatou que a sua cama, as outras camas e várias outras partes da casa estavam tomadas por formigas que formavam as correições e que ficaram por vários dias instaladas pela casa.
Divagou muito nessa recordação das freqüentes invasões de formigas na casa de seus pais; pensou nos diferentes tipos de formigas e nas simpatias várias que aprendeu a fazer com um benzedor que era bom de reza e de mandingas, para dar conta dos despropósitos daquelas danadinhas que insistiam em invadir e recolher o que bem entendessem; tinha até uma simpatia muito individualista que acabava por mandar as formigas embora para as cercanias dos vizinhos, e isso a fez pensar que talvez aquela solitária formiguinha estivesse vindo, por meios de simpatias alheias, de algum outro recôndito lugar. Arrepiou-se toda com essa suposição.
Lembrou da fantasia que alimenta há anos de poder sentar nua sobre um formigueiro e ir aos poucos se sentindo formigar, amortecer, desfalecer e ter todos os orgasmos contínuos possíveis, mas agora, naquele instante, não daria porque era uma só formiguinha perdida no algodão do forro da calcinha. Levantou-se e vestiu com cuidado a calcinha. Nunca se sabe no que é que pode dar esses fenômenos da natureza, mesmo que seja somente uma formiguinha. Aprendeu cedo, já na infância, que não existe formiga sozinha, pois se apareceu uma, pode-se ter certeza de que logo surgirão as demais.
* Escrito publicado, em tempos idos, no Jornal Estilo - Cruz Alta/RS.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Contos Desbotados

DE COPO EM COPO* - Sempre detestara aquelas receitas para viver melhor que são encontradas prontas na boca ou na ingenuidade de qualquer um. Outro dia mesmo, chegara na casa de uma amiga, para o almoço, e encontrou a coitada quase aos vômitos, tentando engolir a água que restara do cozimento de uma beringela, que a cozinheira, a seu pedido, separara, pois afinal estava dito que aquilo fazia bem ao controle do colesterol. Essa amiga não era assim lá tão desinformada, mas daí a sair fazendo essas coisas, francamente! Duas semanas depois dessa visita, lera num semanário absolutamente confiável que aquela história de tomar-lhe beringela pelas goelas estava desmoralizada, pois pesquisas recentes indicavam que não incidia em nada no colesterol. Quase ligou para a amiga para informar-lhe, mas deixou para uma próxima ocasião, pois poderia parecer afetação com os controles da saúde da amiga.
Havia outra pessoa que conhecera num trabalho que fizeram juntas no passado e que todos os dias tinha um ritual assombroso de ingerir muitas capsulas, não lembrava quantas, mas eram muitas. E tinha, também, o ritual de relatar para as outras pessoas os motivos e benefícios de tomar todas aquelas capsulas. Mas percebia-se que talvez aquelas capsulas todas não fizessem efeito algum, pelo menos aparentemente. Nunca pode falar daquilo, pois parecia-lhe que a outra se sustentava um pouco, imaginariamente, na ingestão daquelas capsulas.
E havia uma outra senhora que conhecera numa viagem de ônibus e que tempos depois vieram a encontrar muitas vezes. Aquela senhora era fissurada em livros de auto-ajuda. Passava os dias a seguir os passos e as dicas que lhe eram indicados naqueles livros, mas nunca cuidou de entender e mudar mesmo a vida. Maquiava o tempo todo. Maquiava até os motivos dos fracassos e de comer tanto. Mas não conseguia esconder que comia até na cama, pois deixava os lençóis e o quarto tomados de farelos. E sempre que a angústia ameaçava bater em sua porta, munia-se de seus livros e já estava com a receita pronta.
E encontrara ainda, algumas outras pessoas que se sustentavam nas fantasias com relação àquilo que um dia tiveram financeiramente na vida, mas que não tinham mais. Havia uma que sempre recebera seu salário em moeda corrente no país, mas o enunciava em dólares, puxando um pouco a letra L quando pronunciava a palavra. E outra que sempre falava das coisas que tivera, principalmente dos carros que tivera na garagem.
Passara a vida toda sem colocar um gole de bebida alcoólica na boca. Mas um dia lera um artigo e ouvira um médico, daqueles que inspiram absoluta confiança, dizendo que pesquisas confiáveis indicavam os benefícios de se tomar um copo de vinho por dia, pois devido à sua composição fazia bem principalmente ao coração. Pensou muito e decidiu que chegava daquele seu radicalismo científico e de não acreditar naquelas receitas banais. Buscou uma daquelas garrafas que o falecido havia escondido durante anos. Abriu e tomou o primeiro gole, depois outro, depois mais outro e percebeu que a cabeça já estava um pouco melhor. Sentiu vontade de ouvir música, de cantar e de dançar. Foi aos CD's, que ela era uma velha muito das modernas, e pegou um daquela velhota, a Helena Meirelles, que passara a vida tranqüila, tocando no meio do mato, até que um dia alguém a "descobriu" e se tornou, então, a "Grande Dama da Viola". Pensou que poderia, também, vir a ser a grande dama de alguma coisa. Enquanto ouvia aquela violeira, sentindo o dedilhar dos sentimentos nas cordas da viola, foi tomando muitos goles de vinho. Foi bebendo, cantando e dançando sozinha. Parou no segundo copo, pois não se poderia, assim, se fazer tanto bem ao coração numa vez só.
Depois daquela primeira vez, à tarde, já ficava ansiosa esperando o momento de, à noite, ficar sozinha para cuidar do coração. Às vezes era um copo, mas quando o coração estava mais ruinzinho era dois ou mais copos. Às vezes uma garrafa não bastava para cuidar daquele coração desgovernado que era o seu.
De repente os filhos começaram a perceber e se preocupar, mas no começo deixaram, fazendo de conta que não estavam percebendo, mas depois passaram a ameaçar que a internariam para se livrar do alcoolismo. Isso lhe seria demais. Mandou que cada um fosse cuidar da sua vida e desde então vem tentando cuidar do coração sem tomar o vinho. E está conseguindo. Continua dançando e ouvindo muita música. Seu coração já não está mais tão desgovernado, mas não se arrepende de ter provocado aquele extravio todo em sua vida. Encontrou um terapeuta que está lhe ajudando a mexer naquelas coisas todas que o seu coração guardou tão bem durante anos a fio. Está até pensando em escrever um livro daqueles que dizem como viver melhor. Sem receitas, é claro. Mas destilando da sua existência, o melhor da vida.
* Escrito publicado, em tempos idos, no Jornal Estilo - Cruz Alta/RS.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Máscara: Pedro, o Vermelho - com Juliana Galdino

Máscara: Pedro, o Vermelho - com Juliana Galdino From: revistabravo,de 12 de maio de 2009. Entrevista de Armando Antenore, editor-sênior da revista BRAVO!, com Pedro, o Vermelho, um macaco que se transformou em homem. Interpretado pela atriz Juliana Galdino, Pedro é o protagonista da peça "Comunicação a uma Academia", baseada em texto de Franz Kafka. A entrevista integra a seção "Máscara", publicada mensalmente por BRAVO!


quarta-feira, 14 de abril de 2010

Mercedes cantando a vida!

Hoje tivemos a I Conferência de Saúde Mental - Intersetorial de Cruz Alta. É um momento muito importante para a comunidade em que vivemos, pois coloca-nos a possibilidade de discutir não só a questão do atendimento aos estados de adoecimento mental, mas principalmente para pensar e construir outros modos de vida que não aqueles definidos pela medicamentalização e pelo descuido com a vida!
Uma da painelistas, a médica psiquiátrica Fernanda Penkala, finalizou sua fala, com uma apresentação muito poética, montada com o fundo da música de Mercedes: Eu só peço a Deus... hoje não consegui inserir o vídeo aqui, mas logo coloco. Por enquanto, vai a música!
Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a morte não me encontre um dia
Solitário sem ter feito o que eu queria
Eu só peço a Deus
Que a injustiça não me seja indiferente
Pois não posso dar a outra face
Se já fui machucado brutalmente
Eu só peço a Deus
Que a guerra não me seja indiferente
É um monstro grande, pisa forte
Toda foram de inocência desta gente
É um monstro grande, pisa forte
Toda foram de inocência desta gente
Solo le pido a Dios
Que la guerra que no me sea indiferente
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente.
Es un monstruo grande y pisa fuerte
Toda la pobre inocencia de la gente.
Es un monstruo grande, Pisa fuerte
Toda la inocencia desta gente
Para ouvir: http://letras.terra.com.br/mercedes-sosa/1409304/

terça-feira, 13 de abril de 2010

Poetagens Alheias: "CANTAR DE MARRAKECH"

Das gavetas em que guardo as teias tecidas nos umbrais da existência, resgato essas Poetagens Alheias, que nem lembro em que virtual caminho, recortei: “CANTAR DE MARRAKECH”, de Juan Carlos Bautista - (Dois primeiros fragmentos do livro-poema) - Tradução de Alfredo Fressia
I
Atrás de cortinas de nervos e tonturas,
catedral afundada no sonho
entre onírias espreitando,
estava o Marrakech.
Os caça-níqueis punham seus corvos para voar
e as loucas,
de risos lantejoulas,
encharcavam de olhares o ar.
As bagunceiras, as meigas,
as mornas, as azedas:
nascidas do seu amor medroso
e do cheiro triste da sodomia.
Com seus gestos como punhos
e as mãos cheias de fervor, ladravam:
virgens urrantes
de tardes em declive e noites sem trégua,
estendidas sob o sol baixeiro dos abajures.
No Marrakech eram soberanas,
cruzavam as pernas como senhoritas
e riam como putas.
Obscuras e alegres como algo que vai morrer.
Elas,
as sem vértice,
com o vinagre sempre na língua
e a sede
e a quentura dessa sede.
Iam ao Marrakech exalando cheiro de portos
e cidades de noite.
Rainhas amarelas,
roxas
carregadas na cor.
Rainhas de melancólico fumar
que fitavam descaradas o peixe dos homens,
atrás de cílios egípcios e letargias abissínias.
Cheias de pressentimentos,
fiéis ao embuste,
leves e estridentes como plumas,
passeavam o ódio, a ternura,
a bunda esplêndida,
ao acaso das mesas,
girando com o hábito furioso do inseto.
Iam ao Marrakech e o chamavam alegremente:
O Garra.
O Garrakech ou o Marranech.
Enfeitiçadas ante esse nome crispado e seu conjuro.
—Vamos ao Garra, querida.
Há uma louca que dá voltas.
Há uma bicicleta que anda sozinha.
Há um homem que se ajoelha frente a uma pica
como frente a uma cruz.
Há esfíncteres que são grandes oradores.
Há um pulha lambendo a própria empáfia.
Há um marmanjo com a garganta à meia fúria.
Há um menino com os olhos fechados.
Há paredes para lá de verdes.
Há uma louca que anda sozinha,
como uma bicicleta sozinha,
tão só que dá medo.
—Vamos ao Marrakech, queriiida.
E as nádegas se enchiam.
E os cus abriam-se como boquinhas.
II
Com a fuça inclinada sobre o peito,
a careta de fumaça
e a cerveja a um lado,
os michês,
com a braguilha inchada pelo medo,
vendiam seu lado salobro.
Anjos suntuosos,
anjos pérfidos e doloridos,
gabriéis capitães de lábios arrebentados,
úmidos como tubérculos
que nascem gritando da terra
sua morena brutalidade.
Rebentos do Senhor e da Satanasa,
com sua branca flor crescida no ventre
e o coração açulado pela culpa,
olhavam de soslaio,
ungidos de mágoa,
e sua ereção era uma crueldade refinada.
Obeliscos que se alçavam contra a ruína da noite,
corpos duros e ternos,
com sua luz insidiosa e hábil para o despojamento.
Anjos contra o instinto
que cuspiam os escarros na testa do doente
e no peito de quem guardava,
ruborizado como uma menina,
o coração quente e triste.
Na penumbra do Marrakech
alçavam os sovacos cheios de resplendor
e levantavam vôo até alturas de vertigem
—seu limpo gesto gregoriano.
—E as loucas começavam a
rezar.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

A importância da Vigilância Social

A questão que tento desenvolver abaixo, advém de uma outra problematização colocada pelo colega Cláudio, que é Cuidador Social na rede de Assistência Social do Município de Cruz Alta e que está fazendo formação em Serviço Social, cujo empenho e comprometimento pessoal, teórico e social, reafirmo, muito prezo.
Questão proposta: VIGILÂNCIA SOCIAL - Qual a importância desta para o CRAS, ou como você entende a não utilização desta ferramenta de conhecimento e consequente antecipação das demandas nesta instituição. Isto considerando o pouco tempo da política e do CRAS neste município.
A vigilância social é um instrumento/ uma ferramenta absolutamente importante para o trabalho na rede de atenção e proteção básica em assistência social, pois exige e garante aos trabalhadores da área, o conhecimento profundo da realidade, focado a partir de uma visada teórica que lhes permita ver o mundo com olhos de poesia e de humanidade, operando um trabalho de consistência técnica e de efetivo desenvolvimento social.
O CRAS, ao propor, construir e desenvolver o seu trabalho com a comunidade deve fazê-lo promovendo o reconhecimento do retrato da mesma, assim como, o protagonismo dos sujeitos que a constituem. Vale lembrar, que conhecer a realidade não se trata de olhar no distante fundo do horizonte as nuances que perfazem as suas condições e o seu retrato, mas sim, saber das consistências e das inconsistências/ das continuidades e descontinuidades da história da região em que se trabalha; da plantação dos bairros que fez brotar casas feitas de paredes de existências mais ou menos organizadas; do barrento traçado de suas ruas nuas ou calçadas pelas pedras puras e misturadas com o negrume do pixe; das gentes que fazem a própria história e a história do mundo, através do atravessamento de existências, de restos de existências, de valores os mais diversos e, principalmente, do ideário do sistema capitalísitco (devastador, desigual, explorador, insustentável, que limpa o centro e reforça as margens com seus restos de gentes, de lixos, de vômitos daquilo com que se empanturrou).
Conhecer o traço com que as gentes são feitas, permite-nos construir e operar ações de prevenção, de promoção da autonomia e de atuação protagonista, mas antes devemos desconstruir o assistencialismo e o clientelismo político que habita as cabeças de nós todos/ das gentes com as quais trabalhamos, das gentes que fazem a gestão das políticas públicas e das gentes que operam as políticas públicas.
Como se faz isso tudo? Simplesmente fazendo! Nem as práticas já consolidadas da saúde e da educação nos mostram como fazer, ao contrário, mostram como não fazer. É um saber que se faz fazendo, como todos os outros que não são alumiados apenas pelas teorias que outras gentes tecem com os fios das práticas juntados com os fios dos ideais!
Nos CRAS se está aprendendo a fazer, através da atuação pontual cotidiana que nos mostrou a necessidade de levantarmos objetivamente todas as informações com relação às quais devemos trabalhar na comunidade e, a partir desse levantamento, tecer a cartografia feita a muitas mãos, que nos dará a pintura do retrato do território com que se trabalha, o que embasará, então, a construção –sempre com a participação efetiva da comunidade- do Plano de Trabalho do CRAS. Esse Plano deverá fazer ponto de nó na Rede com as demais políticas públicas, tirando-nos da condição de apagadores cotidianos de incêndios, para fazer-nos, junto com toda a sua gente, pensadores da vida e dos movimentos da comunidade, acompanhando e entendendo suas singularidades e suas necessidades, para construirmos coletivamente os caminhos que lhes convém e de que necessitam.
A Vigilância Social demanda uma nova pedagogia social para os trabalhadores das políticas públicas e para as gentes com que trabalham. Começamos o rabisco de nossas histórias apenas com fragmentos de subjetividades e aos poucos vamos tecendo teias e construindo redes, pois chegamos com o ideário da prevenção e logo vamos vendo que há muito pouco a prevenir num recanto em que a poesia raramente faz morada/ numa comunidade que não é depurada dos problemas sociais/ num mundo em que as gentes muitas vezes não sabem acoierar as letras e as idéias... em que sofrem com a falta de trabalho e renda – e raramente entendem que podem gerá-los... em que há falta de comida, enquanto o Brasil é um de seus maiores produtores... em que há precariedade de casa, de roupa, de dignidade, de condições básicas não para o consumo, mas para ter pernas fortes para existenciar a vida! Encontramos, então, muitas gentes depauperadas, mas uma comunidade que já tem um modo de vida e é a partir disso que o sistema de vigilância social, conhecendo o retrato da comunidade, poderá identificar, trabalhar e racionalizar a atenção às suas necessidades, construindo concomitantemente, as teias da prevenção.
Para plantar o sonho de que um outro mundo seja possível, antes devemos saber que outro mundo é esse que queremos nos por a rabiscar... enquanto vamos firmando seu traço, aos poucos outros vão se achegando para também fazer a sua pintura!

domingo, 11 de abril de 2010

Importância do controle social frente às instituições públicas

A questão que tento desenvolver abaixo, advém de uma problematização colocada pelo colega Cláudio, que é Cuidador Social na rede de Assistência Social do Município de Cruz Alta e que está fazendo formação em Serviço Social, cujo empenho e comprometimento pessoal, teórico e social, muito prezo.
Questão proposta: Qual a importância do controle social frente às instituições públicas? Como esse controle está se dando na prática? E a questão da cidadania ou a falta dela como interfere na viabilização dos conselhos?
A Constituinte Cidadã do Brasil, ao propor o texto e a o corpo da Constituição Federal de 1988, delineia e reforça o traçado da democracia participativa em nosso país (além da democracia representativa), abrindo, formalmente, o espaço do controle da sociedade com relação às ações do Estado no que se refere à gestão das políticas públicas.
O propósito da existência dos vários formatos de expressão do Controle Social reside na possibilidade da comunidade, do cidadão, do sujeito social poder atuar na discussão, decisão, fiscalização, proposição, avaliação e redimensionamento das políticas públicas, assim como, na operacionalização da atuação do Estado em seus diferentes campos de abrangência.
No que se refere aos Conselhos –basicamente os de âmbito municipal-, é possível afirmar que na maioria das comunidades os mesmos são feitos de uma precária teatralidade. Seguem um dado padrão de organização no que se refere aos aspectos formais e à representatividade que os compõem, mas apresentam uma notória miséria humana, técnica e política daqueles que ali se assentam representando as Instituições. Esses representantes muitas vezes desconhecem inclusive o propósito de estarem na condição de conselheiros, assim como, desconhecem as questões e os assuntos que lhes é dado discutir e decidir. Dados esses condicionantes, na maioria das vezes os Conselhos são manipulados por pessoas que detem (efetivamente detem) o conhecimento sobre os temas em pauta, ou mesmo, pelos Gestores que costumam dar-lhes uma atribuição instrumental e meramente formal, visando à aprovação e manutenção daquilo que lhes interessa.
O formato que observamos na operacionalização dos mais diversos Conselhos, ganhou desenho exatamente na não-participação da comunidade, seja por desinteresse, alienação ou falta de fomento à atuação participativa. Isso tem sido determinante na manutenção de relações de poder basicamente representativas e de dominação, em que, não havendo efetiva participação para a discussão e construção das decisões relacionadas aos interesses da comunidade e pertinentes à vida dos cidadãos e das comunidades, mantem-se o controle operado pelo poder burocrático e vertical do Estado.
Essa situação pode ser modificada na medida em que as gentes forem provocadas pela própria comunidade à atuação protagonista, tornando-se, além de atores da própria existência, responsáveis pelas coisas da vida e pelas coisas do mundo, superando as condições de assujeitamento aos interesses do Estado e das estruturas de dominação da comunidade e de suas gentes.

sábado, 10 de abril de 2010

O Catador de Alegrias

Saia na porta de casa, com os pensamentos escorrendo entre uma idéia e outra, quando apontou no portão um saco de plástico, daqueles em que é embalado o adubo químico. Logo atrás veio um nômade que de tempo em tempo habita as ruas do bairro em que moro. Sua figura é de uma intensidade que me atinge. Nórdico, com imensos olhos azuis, está sempre sorrindo.
Parado no portão, perguntei-lhe, sorrindo, o que estaria carregando nos sacos e ele lascou: “para um sorriso que sempre me sorri, trago aqui, sacos cheios de alegria”, de volta, tive que sacar de um verso e perguntei-lhe: em sacos que carregam tanta alegria, acaso teria também poesia?, e ele, mandou de volta: “se tem alegria, só pode ser porque tem poesia!”... e dedilhou em seu violão imaginário, uma música que disse não lembrar a letra, mas que era de pura poesia.
Esse é um homem que chamo de nômade acertático, em contraposição aos que insistem que seja errático. Vive na rua por sua própria escolha, pois se despediu da noção de casa privada. Sua casa é o mundo. No rigor do inverno de 2009, perguntei-lhe se não queria passar as noites no albergue e ele retrucou que lá tem normas que não são as dele... uma das normas é que tem que se banhar pra poder ficar e, também, ir dormir nos horários determinados. Ele não quer isso. Quer o mundo.
Com a volta do nômade acertático, lembrei da história que um amigo me contou há mais ou menos duas semanas. Esteve em Brasília e uma amiga apresentou-lhe um amigo que fora Engenheiro Civil e que decidiu trocar sua profissão e sua vida privada, pela vida na rua, pela vida pública (que não é a mesma vida dos ditos “homens públicos”)... que eu, particularmente, entendo como a vida no mundo, porque a rua é o espaço de transitar... e talvez seja, mesmo, “morar na rua”, tomando-se a noção de rua como a possibilidade de transitar no mundo.
Mas, enfim, esse Engenheiro, entendendo que ninguém confiaria uma obra a um morador de rua, desvencilhou-se das alegorias que sua formação lhe garantia no mundo capitalístico e passou a ser Engenheiro de formas alternativas de habitação, projetando e construindo habitações de papel e de outros materiais reaproveitáveis... talvez, ele não tenha se desapegado absolutamente do espaço privado, mas reinventado a sua possibilidade de vida, trocando formas predatórias, por formas sustentáveis de fazer o morar e de fazer o existir.
O nômade acertático que me encanta em versos, nem de casas quer saber... não necessita disso... carrega a alegria em sacos e distribui a poesia em versos... sem ter um lugar exato pra onde ir, vai sempre para os exatos lugares em que encontra, no traçado de seus caminhos, a poesia que habita seus sacos!