quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

SONHOS À BEIRA DO CAMINHO

outro escrito de idos tempos... com data de 29. 06. 2000... nesse tempo eu ainda falava de sonhos...
___________________________________
            À beira do caminho deixamos todos aqueles sonhos que para sempre perseguiremos... o sonho de ser alguma coisa/ de ser alguém quando crescer, o sonho de ter uma letra mais bonita, de saber fazer poesia, de conseguir escrever um texto com introdução/desenvolvimento/conclusão, como nos ensinaram, incansavelmente, nossas professoras de português; o sonho de conhecer um daqueles cientistas de que nos falavam os professores... um daqueles que, no imaginário de nossa infância, faziam o mundo acontecer porque renunciavam a tudo para passar o tempo a decifrar os segredos do mundo!
          Abandonamos alguns sonhos para inventar outros, para podermos viver, para buscarmos a promessa do encontro sempre adiado daquilo que possa nos sustentar... esquecemos, um pouco, as misérias do mundo, porque estamos lidando com nossas próprias misérias, isso se torna maior que a nossa capacidade de ver o mundo.
            E queremos ser humanos quando os humanos demonstram tudo o que pode vir de um humano... queremos explicar porque as pessoas não podem ser feitas todas da mesma fôrma ... queremos fazer poesia quando o mundo cai e ficamos, ainda tentando segurar... e cantamos alguma canção enquanto disfarçamos a alegria de ter encontrado alguma coisa que procurávamos muito... nos apaixonamos pelas pessoas erradas... erradas? Ou pelas pessoas certas e que nunca teremos coragem de assumir?
        Inventamos formas de poder/ inventamos formas de ver a vida, criamos recheio para a nossa existência e, muitas vezes, esquecemos que há muitas outras existências a serem recheadas!
            Seguimos formas assépticas de viver a vida... alimentação saudável e na hora certa... mínimo de oito horas diárias de sono, com quarto arejado e cama confortável... roupas confortáveis... banhos diários... exercícios físicos regulare ... trabalhar  num lugar que nos garanta as condições, pelo menos mínimas, para o exercício profissional, com salário regular e justo, com ambiente saudável e construtivo!
            Somos assépticos/ de uma assepsia burguesa surpreendente até que nos damos por achados, em meio ao meio/ ao eixo de nosso trabalho asséptico, lidando com um mundo completamente diferente do nosso, um mundo que a academia não nos avisou que encontraríamos, um mundo de pessoas que não têm o que comer, nem hora, nem dia para fazê-lo; um mundo de pessoas que não têm onde dormir, e quando têm... não queremos nem imaginar como seja... e das roupas, nem se fale... muitas vezes são roupas de marca, dessas marcadas por campanhas do agasalho realizadas por pessoas que acham que amontoar seres humanos num ginásio seja um fato de dar inveja; um mundo de pessoas que já não vêem diferença em estar ou não banhado e que fazem exercícios físicos regulares porque andar é o mais comum quando já não temos mais sonhos para deixar à beira do caminho; um mundo onde a maioria das pessoas não têm trabalho e o nosso próprio trabalho é precário diante a dimensão da precariedade do mundo daqueles que não têm trabalho.
             E quando ainda queremos sonhar algum sonho, nem que seja para deixar à beira do caminho, deparamo-nos com a crueza da vida de cada um... como de uma senhora que, morando sozinha, fechada em sua casa, já alucinando depois de passar vários dias sem comer, expelindo todos os produtos que seu corpo ainda conseguia produzir, escamando a pele envelhecida e desidratada, sem banho, com seus olhos remelentos, com sua urina ressequida em sua roupa sem marca e suja... aquela senhora, que não estava conseguindo articular suas idéias, pede um tempinho à mais para organizar seu pensamento e diz que necessita de um companheiro ... não um companheiro para fazer “aquilo”, mas para poder espantar a solidão, para poder acordar sedo, conversar e ter alguém com quem pudesse “fazer planos”... já dizia alguém que morremos um pouco quando perdemos a capacidade de sonhar... mas podemos viver um pouco se tivermos lugar em nossos sonhos para aqueles que também ainda sonham... nem que seja para fazer planos ou para encher nossos caminhos de sonhos que nos levam a outros sonhos e à vida!

ABRE AS PERNAS MULHER!

outra composição vinda de um tempo ido... também veiculada no jornal estilo, antanho...
_______________________________________
“As pessoas escrevem a partir de uma necessidade de comunicação e de comunhão com os outros, para denunciar aquilo que machuca e compartilhar o que traz alegria. As pessoas escrevem contra sua própria solidão dos demais –porque supõe que a literatura transmite conhecimentos, age sobre a linguagem e a conduta de quem a recebe, e nos ajuda a nos conhecermos melhor, para nos salvarmos juntos.” Eduardo Galeano
Desculpe-me, quem lê estas mal traçadas, se às vezes trago muito mais tristezas do que alegrias/ muito mais solidão do que solidariedade/ muito mais ignorância do que conhecimento... desculpem-me por às vezes ser vulgar... desculpem-me se às vezes tenho uns desatinos, porque acontece de eu ser assim tão desatinada quando vejo o encontro da realidade com o absurdo/ tenho essas coisas de sair fervendo, mesmo enquanto muitos saem somente a balançar a cabeça como que dizendo que o mundo e as pessoas são assim mesmo, do jeito que são... a esperança me brota em minhas veias sempre que tenho a impressão de que vou morrer quando dobrar a próxima esquina da existência... com essas coisa vou lidando, tranquila e no passo da vida, mas há outras que simplesmente me fazem gritar e espernear, e uma delas é a  opressão... porque quem é feito de carne, osso e vida não pode rastejar enquanto outros lhes pisam a cabeça!
“Abre as pernas mulher!” é uma frase que condensa dois raios de opressão, um de sua própria enunciação e outro do enunciado “fecha as pernas mulher” , e talvez ainda um outro vindo das convenções que reproduz aquele que os enuncia... hoje já vou falando, assim de cara, dessas coisa de mulher abrir as pernas, porque dia desses eu não vi, mas minha amiga Beth viu, ouviu e lambanciou (sic!) comigo sobre uma entrevista exibida, não lembro em que canal de televisão, com o cantor e compositor Tom Zé, brasileiro que acho que ainda está radicado nos Estados Unidos... lamento que tenha tido que ir pra lá para ser visto por aqui... gosto muito desse sujeito, não só por ser ele um sobrevivente da sociedade, da subjetividade e na luta permanente com o mercado, mas principalmente por ser um sobrevivente cultural.
E entre muitas coisas bonitas e interessantes que ele falou nessa entrevista, quando estava vestido com as provocativas roupas com que se orna em seu mais recente show, foi do dilema da mulher resultante da opressão... perguntava-se como é que a mulher vai gozar/ vai ter orgasmo se foi criada ouvindo a determinação “fecha as pernas menina/ fecha as pernas mulher” e passa a vida tendo que se recolher e negando sua própria sexualidade, para de repente lhe aparecer o mesmo sujeito que a oprime, dizendo abre as pernas mulher” e ela tem que abrir como condição que lhe és dada e posta... por essas e outras demoramos anos e séculos para construir o conhecimento sobre o orgasmo, enquanto muitos pensam que é apenas uma questão de abrir as pernas e muitas passam anos a evitar inclusive pensar sobre o assunto, logo, passam somente abrindo as pernas, quando o cansaço, ou a dor de cabeça, ou o mal-estar, ou qualquer outra coisa seja maior para impedir o trágico momento de abrir as pernas!
Isso me faz pensar na opressão em sentido amplo, por exemplo, algumas pessoas tem o estranho poder de oprimir aqueles que em seu imaginário lhes representam perigo/ algumas pessoas produzem o estranho efeito de desmobilização dos outros seres humanos... tipo as pessoas que trazem acorrentado em seus calcanhares imensas e inúmeras coisas e questões mal resolvidas, mal conduzidas e mal elaboradas em suas vidas... essas pessoas tem o incrível poder de transformar tudo o que tocam em titica ou algo assemelhado... elas tem o poder quase absoluto de sempre encontrar, em qualquer situação que lhes apareça, um motivo para brigar, para falar mal, para detonar, para resmungar ou para aumentar a incrível e visível carga que carregam, com a qual ocupam todo o espaço em que estejam, física ou imaginariamente.
Nos encantamos, por exemplo, com um olhar vivo, intenso e brilhante, que porta em si a vida que pulsa dentro que ser que o expressa, mas também recuamos e entristecemos com o olhar opaco daqueles cuja visão não consegue transcender o contido limite do próprio entristecimento que a vida (ou a falta de vida) lhes causa!
Num outro dia ouvi uma Supervisora (daquelas que têm a SUPER visão) orientando os educadores de uma certa escola, no sentido de estarem atentos às formas de tratamento entre os seus pares, sendo que deveriam se referir uns aos outros como “professor fulano de tal” e as Diretoras não poderiam ser chamadas por seus apelidos, mas sim pela profissão, seguido do cargo e do nome... como se isso garantisse qualquer respeito da parte dos alunos e dos colegas... só faltou implantar o regime militar dentro da escola!
Concluo com Rubem Alves e Galeano “A solidão é para poucos. Não é democrática. Não é um direito universal. Para ser um direito de todos teria de ser desejada por todos. Mas são poucos os que a desejam. A maioria prefere a agitação das procissões, dos comícios, das praias, da torcida: lugares onde se fala o que todos entendem. A democracia é um jogo que se faz com coisas que podem ser ditas. Na democracia os segredos são proibidos. É um jogo do qual todos devem participar. É coisa boa, ideal político bonito que deve ser buscado para o bem-estar de todos. Nela, porem, não há, nem poderia haver, lugar para a solidão e o segredo. A democracia é ave que nada na superfície do mar. Não é peixe das funduras. Ela vive do jornal, da informação, do que é público...” (...) “A gente escreve para despistar a morte e destruir os fantasmas que nos afligem, por dentro; mas aquilo que a gente escreve só pode ser útil quando coincide de alguma maneira com a necessidade coletiva de conquista da identidade.”
“Ao fugir, salvei mas também perdi minha vida. Durante anos só soube que existia porque enxergava os outros vivendo.”... esta frase é de um angolano, mas pode ser de qualquer um de nós! 

A VIDA A GENTE INVENTA, A HISTÓRIA A GENTE CONTA, O MUNDO A GENTE TRAÇA

este é um escrito já publicado no jornal estilo, em tempos idos (há uns dez anos, mais ou menos)... estou re-olhando essas letras, para juntá-las em outras composições...
__________________________________________

            Quero fazer uma homenagem, neste escrito, a uma idosa que, mesmo com ares de guria, completa, por esses dias, seus setenta e poucos anos, e, por extensão, relembrar uma data comemorativa com relação ao idoso, que ocorre também por esses dias ... Juracema Fontoura, essa guria de setenta e poucos anos -viúva de um velho comunista que já encilhou seu pingo e foi campear em outras veredas de nosso imaginário, mas deixou na parede de sua casa a foice e o martelo, símbolos de suas crenças e de seus ideais-, chamo-a por borboleta porque, junto com sua irmã -outra borboleta de setenta e poucos anos-, dá suas revoadas tranquilas e breves, e retorna ao ponto de onde saiu ... fazem isso com freqüência, tanta que sua bisneta, com suas asinhas em aprendizagem já é a borboletinha ... mal sai do casulo e já dá muito trabalho.
            Uma sua filha perguntava-me: teremos os mesmos desígnios quando chegarmos a tal idade? E isso me fez lembrar que, quando criança, sonhava com os tempos da adolescência que logo chegariam; e seguindo o que é próprio da condição humana, de nunca alcançar a completude e o que efetivamente se quer, quando adolescente, almejava, sedenta, a idade adulta, pensando que poderia nunca perder as coisas que a infância me permitia ver e fazer; chegada à condição de adulta, vi que teria muito por amadurecer, e agora, quanto mais cresço subjetivamente, mais almejo ficar velha, sonhando que então, com toda a experiência da caminhada da vida, possa viver e agir com mais maturidade!
            Sempre mantive relações de amizade com pessoas mais velhas do que eu, principalmente pela precocidade granjeada no convívio no moinho e no balcão do bolicho do meu pai... tenho uma amiga que vai mais de duas décadas à minha frente, e às vezes, quando ela tece censuras ou considerações pertinentes à algumas experimentações por mim feitas, tenho que lembrar-lhe que quando eu nasci ela já estava domando boi a unha!
Relembro com carinho os velhos que habitaram a minha infância e que viverão para sempre em meu imaginário... o seu Pedro Rosa, que me benzia contra cobreiro, anemia, tristeza e quebranto... o compadre Mário, preto velho que picava o fumo em corda para fazer o seu palheiro, enquanto contava histórias de forma tão convincente que acreditei por muito tempo na veracidade das lendas que ele reinventava para me entreter; fui visitá-lo quando já chegava ao fim da vida, estava cego, bastou a minha presença para saber que eu tinha chegado; eu dava-lhe um pedaço de fumo sempre que ia ao bolicho, pois lhe associava à figura do saci pererê... o compadre Homero, que visitei há pouco tempo e me recebeu com um literal quebra-costelas, contava-me histórias de lobisomem de forma que ainda hoje acredito que possam existir, e ensinou-me o apreço pelos bancos de madeira -aqueles de três pés-, assim como moer a cana para tomar a garapa e fazer melado... a comadre Maria, que me contava os segredos das plantas e me ensinou a esperar amadurecer aquele casulinho que guarda as sementes do beijo para então estourá-los, e me disse, também, que um pé de butiá (uma das minhas frutas preferidas) demoraria sete anos para dar frutos, desde então conto ciclos pensando em plantar butiá e desistindo, pois demoraria muito tempo para colher a fruta, quando vejo que se passaram mais sete anos, penso que poderia ter plantado, acho que a minha vida mudará radicalmente no dia em que plantar um pé de butiá... e tantos outros velhos, que aqui não cabe!

            Prestamos aqui a homenagem a todos os idosos -tanto aqueles que estão na "melhor idade", como aqueles que sofrem o malogro do abandono, da falta de sentido para a vida, da tristeza, da falta de respeito de seus familiares-... idosos que, na forma que lhes foi possível, ajudaram a construir o mundo em que vivemos e, se deixaram problemas, seguimos a sina do ser humano lutando para construir um mundo melhor... enfim, a vida a gente inventa, a história a gente conta e o mundo a gente traça!

SOBRE GILLES DELEUZE (1925-1995)

Entrada del diccionario de Filosofía Herder.
 
Filósofo francés contemporáneo cuyo pensamiento se inscribió inicialmente en el movimiento estructuralista y en las llamadas filosofías de la muerte del sujeto, aunque su pensamiento, creador e iconoclasta, es inclasificable. De él dijo Michel Foucault que era “el único espíritu filosófico de Francia”, y que el siglo XX sería deleuziano. Estudió filosofía con F.Alquié, G. Canguilhem, M. Merleau-Ponty y J. Hyppolite en la Sorbona. Ejerció como profesor de filosofía en varias ciudades de provincias, y posteriormente simultaneó su docencia en París y en Lyon.
Desde 1969 fue profesor de filosofía en la universidad París VIII - Vincennes, hasta su jubilación en 1987, fecha en la que pasó a ser profesor emérito. Una de sus últimas actividades fue la de colaborar con la cadena de televisión ARTE narrando su visión del mundo a partir del abecedario. Afectado por una grave insuficiencia respiratoria, se suicidó el sábado 4 de noviembre de 1995 lanzándose por la ventana de su apartamento de la avenida de Niel en París. Esta muerte trágica se suma a la muerte de Foucault (que murió en 1984 víctima del sida), al suicidio de Guy Debord y de Nikos Poulantzas y a la muerte de Althusser (murió en 1990 ingresado en un psiquiátrico después de haber asesinado a su mujer), y cierra un sombrío destino de la llamada escuela de París de los años 60-80.
Según Deleuze, la tarea de la filosofía actual es la de pensar las condiciones que hacen posible la aparición de las nociones mismas de ser y de sujeto que están en la base de la filosofía moderna, la cual, a su vez, surgió por la necesidad de fundamentar el ser en el sujeto debido al fin de las metafísicas del ser que se produjo al final de la Edad Media. Esta investigación sobre la aparición de las características de la modernidad entendidas a partir de la aparición de la noción de sujeto, Deleuze la comparte con autores como Foucault, por ejemplo, y la efectúa bajo la inspiración de Nietzsche (y, en parte, de Heidegger, aunque Deleuze considera que el pensamiento heideggeriano sobre la diferencia ontológica es un retroceso respecto de Nietzsche). Se trata de mostrar que hay un fundamento anterior al ser y al sujeto, y al ser como sujeto. Se trata, pues, de desconstruir (aunque esta terminología no es deleuziana) la subjetividad y criticar la idea según la cual el sujeto y su representación son el punto de partida y el fundamento. Con ello aborda una nueva forma de pensar, en tanto que se trata de pensar lo no-pensado y velado por la lógica de la identidad.
Esta forma de pensar, que en Deleuze se desarrolla a partir del estudio minucioso de grandes filósofos (su primera producción filosófica son una serie de monografías sobre el materialismo de Lucrecio, el panteísmo de Spinoza, el empirismo de Hume, el vitalismo de Bergson, el pensamiento de Kant y el de Nietzsche), se desarrolla a partir de la crítica de la línea de pensamiento que va desde Platón a Hegel pasando por el cristianismo y Descartes, y que se ha basado en el dualismo entre materia y espíritu. Contra este dualismo Deleuze reivindica el proyecto nietzscheano de la inversión del platonismo, y una concepción de lo real entendido como formado por una multiplicidad de planos sin cabida para aquel dualismo ni para un pretendido privilegio del sujeto como polo de referencia. Esta crítica del dualismo la sustenta Deleuze en el vitalismo de Bergson (hasta el punto de que puede considerarse a Deleuze como el desarrollador del bergsonismo), y en el vitalismo de Nietzsche (que Deleuze contribuyó a su revitalización como pensador, y fue uno de los grandes impulsores del renovado interés por este pensador). El élan vital de Bergson, como el eterno retorno nietzscheano aparecen como afirmaciones incondicionales de la vida frente al pensamiento negativo de raíz platónica, cristiana y que culmina en las nociones de alienación y dialéctica en Hegel. En lugar de la negación de la negación, Deleuze, siguiendo la crítica nietzscheana al hegelianismo, sustenta la afirmación de la afirmación. Por ello la filosofía no puede limitarse a ser crítica, sino que ha de ser creadora de valores nuevos, y efectuar aquella tarea de pensar lo no pensado, así como pensar las bases de la aparición del privilegio metafísico del ser entendido como identidad, y el privilegio del sujeto. Si en la demolición del dualismo de raíz platónica Deleuze se inspira en Nietzsche, la puesta en cuestión del principio de identidad y del papel del sujeto se inspira en sus estudios sobre el empirismo de Hume (que, a su vez, es uno de los puntos de partida de la filosofía de Bergson).
Deleuze muestra que lo que aparece tras la subjetividad no es la antigua noción de el ser, sino la diferencia; el ser como diferencia, el ser como tiempo. El tema de la diferencia es el núcleo del pensamiento de Deleuze, el cual considera que la noción imperante de subjetividad y de identidad es la que ha imposibilitado el pensamiento de la diferencia. La elaboración de un pensamiento de la diferencia, no subordinado a la identidad, implica una relectura de la historia de la filosofía ya que, según Deleuze, en filósofos tales como Lucrecio, Spinoza, Leibniz, Hume, Kant, Nietzsche y Bergson ; en literatos como Proust, Sacher-Masoch o Kafka; en determinados aspectos de la noción psicológica de inconsciente y en pintores como Bacon, se definen implícita o explícitamente aspectos clave del ámbito de la pre-subjetividad (la duración bergsoniana, por ejemplo, que es constitutiva del sujeto). De ahí la serie de estudios monográficos que Deleuze elabora sobre los autores mencionados. Así, por ejemplo, analiza la filosofía de Hume y con él se pregunta ¿cómo es posible que a partir de lo dado pueda construirse el sujeto? Como Hume, considera que son los hábitos quienes lo constituyen pero, entonces, son éstos los que nos tienen a nosotros y no nosotros a ellos. En lugar de una teoría de lo que hacemos debe elaborarse una teoría de lo que nos hace. Como Bergson, afirmará que todo organismo es un conjunto de contracciones, retenciones y esperas; un pliegue de la materia-imagen, del tiempo-duración, pliegue que aparece como diferencia.
La filosofía del ser y del sujeto basada en el ocultamiento de la diferencia ha considerado dos tipos de diferencias: a) la diferencia conceptual e intrínseca (según la cual x e y son diferentes cuando no pueden definirse de la misma manera) y b) la diferencia no conceptual o extrínseca (según la cual x y x' son diferentes por el hecho de no ocupar el mismo espacio, aunque puedan definirse de la misma manera). En ese caso, la diferencia no conceptual es concebida como repetición de lo idéntico, pero Deleuze niega que la repetición sea la reproducción de una realidad originaria: no puede haber una repetición no conceptual, de manera que la repetición no es nunca una repetición de un modelo originario. De esta manera, pone en cuestión las teorizaciones del principio de identidad y de la noción clásica de sujeto que, para Deleuze, es siempre necesariamente heterogéneo, y su pensamiento, de raíz bergsoniana, es el de lo cualitativo, fuera de toda cuantificación. Ello no invalida la necesidad del estudio matemático, pero Deleuze señala dos estructuras topológicas diferentes del espacio: la estructura estriada, que procede de un punto de vista fijo, y la estructura lisa, que es el lugar del devenir, del flujo y de las multiplicidades intensivas, que se correspondería al mundo de un cuerpo sin órganos.
El conjunto de las investigaciones y resultados de sus estudios los expone Deleuze en sus obras fundamentales, tales como Diferencia y repetición (1968); La lógica del sentido (1969, obra que trata una diversidad temática, y en la que estudia autores como L. Carroll, los estoicos, Klosowski, Gombrowicz, Joyce, etc.); El pliegue; Cine 1: la imagen movimiento (1981); Cine 2: la imagen-tiempo (1985). Obras, todas ellas, que han tenido una gran influencia en el pensamiento contemporáneo, en autores como Foucault o Paul Virilio, por ejemplo. En Diferencia y repetición Deleuze aborda la “cuádruple raíz de la representación”: la identidad, la analogía, la oposición y la semejanza, y el panorama ontológico que surge de este estudio no es ya el de un mundo poblado por sujetos u objetos, sino por singularidades libres, asubjetivas y preindividuales; intensidades virtuales bergsonianas, esencias espinozianas y fuerzas nietzscheanas. En El anti-Edipo (1972), escrito en colaboración con el ex psiquiatra Félix Guattari (nacido en 1930 y muerto en 1992), estudia otra de las condiciones de la pre-subjetividad, la noción de inconsciente, y aborda la relación del psicoanálisis con la política y la historia. En esta obra se afirma que el psicoanálisis, en tanto que se sustenta en un modelo familiarista tradicional (lo que se manifiesta en la misma importancia otorgada al complejo de Edipo), no es más que un instrumento de represión, entre otros, incapaz de comprender la realidad del deseo individual, que Deleuze y Guattari muestran multiforme, creador e imposible de canalizar. De hecho la misma noción del complejo de Edipo es, según Deleuze-Guattari, una manifestación de aquella noción viciada de la repetición: es el deseo actual del sujeto como repetición alienada de una catexis originaria que lo sigue atando a la madre e instituye el deseo como negatividad, de manera que todo deseo ulterior será concebido como una repetición imperfecta de aquel primer deseo originario. En contra de ello Deleuze y Guattari sustentan el carácter plenamente afirmativo del deseo, y señalan que las repeticiones no son reproducción de ninguna relación originaria fundante: no hay repetición de un primer término. Por ello, contrariamente a los análisis clásicos que insisten en la relación del deseo con la carencia (ésta es la interpretación de Platón en El Banquete y Freud en el complejo de Edipo), Deleuze lo presenta como orientado, de hecho, hacia la producción y la articulación de soluciones inéditas: desear es transgredir las normas y hacer aflorar flujos profundos. Por otra parte, no es el deseo el que se convierte en necesidad, es todo lo contrario: son las necesidades las que se convierten en deseo. En Mil mesetas (1980, segundo tomo de “Capitalismo y esquizofrenia”, obra de la cual el Anti-Edipo es la primera parte), se prolonga esta concepción del deseo y de la máquina deseante, el estudio de las estructuras lisas y estriadas del espacio, y se dirige fundamentalmente a sus consecuencias políticas.
buscado em: cooperação.sem.mando