terça-feira, 7 de setembro de 2010

Abandono

As mãos travaram. Os braços endureceram. As pernas tornaram-se meros veículos de locomoção. Ainda ria, como todo mundo ri, mas nunca mais sorriu, principalmente aquele sorriso bonito feito de uma felicidade sem medida. Aos poucos foi tocando cada coisa em que portasse a sua presença. Fechava os olhos e tocava, de leve, cada coisa. Esperava a sua voz no outro lado da linha, como um bálsamo para tamanha dor. Depois, percebeu que a voz fazia doer mais. Os dias ficaram por muito tempo sem cor, até que um dia percebeu que o sol latejava ao seu redor, mas não conseguia abrir suas janelas para deixá-lo entrar. Olhava ao seu redor, olhava pra trás, tentando entender de onde haviam lhe arrancado e onde é que tinha sido largado, mas não conseguia entender nada. Sentou quieto, num canto, esperando que uma lufada de vento o ajudasse a respirar. Foi quando viu, jogado perto da porta, um saco velho e sujo, com alguns pequenos buracos puídos pelo tempo e a boca fortemente amarrada. Olhou para o saco e teve um sentimento de familiaridade. Aproximou-se e percebeu que algo se mexia dentro do saco. Foi quando ouviu o seu próprio gemido. Com as mãos travadas e os braços endurecidos, lá de dentro do saco, entendeu que necessitava de ajuda para desamarrar sua vida. Pediu socorro e ninguém lhe ouviu. Foi morrendo aos poucos, sem nunca poder dizer a ninguém como é que fora amarrado dentro daquele saco sujo.

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