terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

divulgação: hypomnemata 129 - Ardor

hypomnemata 129
Boletim eletrônico mensal
do Nu-Sol - Núcleo de Sociabilidade Libertária
do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP
no. 129, janeiro de 2011.
Ardor
A recomendação para a massa, o povo, a multidão é que proteste pacificamente, requeira autorizações para fazer passeatas, compareçam às urnas quando convocados, sejam solidários nas catástrofes e zelem pela segurança de todos.
Quem fugir da cartilha está condenado a ser chamado de baderneiro, anarquista, rebelde sem causa, revoltado necessitando atenção e medicação, vagabundo desleixado com seus deveres de cidadão.
Está mais do que claro que empresas e Estado, mais ou menos afinados com sindicatos, políticos profissionais e a sociedade civil transterritorial organizada, são os responsáveis por assegurar a permanência e a pretensa perpetuação das instituições democráticas.
O sujeito deve saber respeitar e obedecer às organizações, às regras, às leis e aos comandos, segundo aética da participação no consumo, na política e no social: deve relativizar com as novas formas do racismo, da eugenia, do nacionalismo; deve evitar e combater quaisquer fundamentalismos em nome das imprescindíveis negociações em função da melhoria das condições de vida; deve aprender a sobreviver!
Para cumprir o simples procedimento recomendado, o cidadão deve ser religioso, porém não extremista; politizado, mas jamais anarquista; envolvido com inclusões dentro dos regulamentos e das regulações para denunciar impunidades e mostrar sua boa conduta. O sujeito deve: ele é um devedor!
O sujeito é o cidadão, e por vezes o aspirante a cidadão, em busca de um reconhecimento: pode ser o miserável favelado atado ao tráfico de drogas e/ou de órgãos, o trabalhador chinês aprisionado nas grandes corporações lucrativas, o idiota nacionalista do leste, o celerado religioso do oriente médio, o trabalhador refém dos proprietários exportadores de mão de obra... este sujeito está subordinado a alguém poderoso que lucra com a legalidade e ilegalidade de seus negócios.
O acesso ao consumo se amplia, com ou sem crises, pela legalização das transações ou pela sua diversificação em ilegalidades inevitáveis; a participação social e política se avolumam e é preciso ser paciente, cordato, amável, pacífico e ordeiro para sobreviver!
Ele (e ela) não deve se insurgir, mas agradecer. No limite, protestar e reivindicar com autorização na esperança de que tudo melhorará!
O sujeito deve amar sua condição de sujeitado e ao mesmo tempo adorar a obediência. Deve ser um amoroso adorável!
Deve aprender a negociar, a aceitar emprego como voluntário até ser incorporado e depois vir a obter a carteira de trabalho assinada. Deve continuar amando sua prisão no trabalho, seja sob comando da planificação comunista ditatorial, do planejamento empresarial, da anarquia do mercado; deve trabalhar para alguém, vir a ser alguém na estrutura de qualquer empresa legal ou ilegal e atuar para obem de quem lhe paga. Deve obedecer no trabalho, na prisão, em qualquer confinamento, e seguir as regras rígidas e pouco conhecidas da Internet, que lhe propicia a ilusão de liberdade e livre trânsito no seu lar, nas ongs, na magnitude solitária e eletrônica dos que se imaginam livres, em busca de um emprego.
Ele (e ela) deve ordenar a sua vida para o empreendedorismo pessoal, social e ambiental, para melhorar a sua condição de sobrevivente, dos semelhantes e do planeta.
E nisto não há nenhum fundamentalismo, apregoam todos que se aninham na velha e eficaz condição de centro: centro-direita, centro-esquerda, mas sempre exigentes de obediência à autoridade centralizada, mesmo quando a existência dos sobreviventes é organizada pelas variadas formas de descentralização de procedimentos nos empregos. Serão felizes, serão alguém no futuro, famélicos de vida, mas satisfeitos com a sobrevivência.
Quando, de repente, aparecem os insurgentes, eles são rapidamente colocados lado a lado com fundamentalistas religiosos, às vezes na circunvizinhança de milícias fascistas ou de embolorados revolucionários comunistas, e em nome da liberdade desta democracia no capitalismo são desqualificados, renomeados perigosos e novamente identificados como anormais.
Quando a mídia denuncia os que ultrapassam a zona demarcada dos protestos e das reivindicações, ela alardeia para o perigo anarquista. Os anarquistas têm sim propostas sérias e imediatas; eles não reivindicam reformas e melhorias ao estado das coisas: querem o fim das desigualdades e assimetrias, da autoridade centralizada, das sujeições e dos assujeitamentos; querem liberdade para produzir livres de proprietários privados e estatais; querem cultura libertária e não escolarização acentuada e ongueira; querem saúde e não planos de assistência; querem o fim da polícia, da polícia articulada com acomunidade, das prisões e dos exércitos; querem que todos saibam que nada é eterno e que é impossível melhorar na sobrevivência: querem viver!
Viver numa democracia é ampliar e intensificar liberdades e não apenas restrição por limites.
Assim como não há capitalista que despreze a adesão dos trabalhadores e miseráveis aos seus programas e planejamentos, não há nada de surpreendente que jovens abastados, fartos do oco consumista e do devedor cidadão, decidam-se pelos anarquismos, pela revolta!
Da mesma maneira que em nome da nação e do Estado as desigualdades sócio-econômicas se diluem em igualdades formais jurídico-políticas, representações e em participação ampliada nas empresas e na política, lutar contra as velhas e novas ordens do poder é um efeito da democracia, é sua saúde!
Não há nada de terrorismo na ação dos anarquistas espalhados pelo planeta, articulados ou não pela Internet. Esta é uma nova forma do controle e ninguém é inocente para achar que está navegando livre dos provedores. A Internet serve para facebook, wikileaks, wikipédias, Google administração e controle de empregados e lucros, serve a todos e a qualquer um em sua solidão, sob o controle dos provedores, crescimento da governança da Internet e o desenvolvimento de uma série de procedimentos para o seu bom uso para a segurança de todos e de novos direitos aos deveres.
Os anarquistas seguem gritando, botando fogo, sem respeito algum pela propriedade e nem pelas migalhas. Dispensam esta vidinha. São contra o governo e contra o capitalismo, porque a propriedade e suas sobras borbulham daí. Estão despertos e perigosos para os satisfeitos, seus bens e seus moralismos: recusam a normalidade!
A vida e a liberdade são muito mais do que se conquista com a propriedade. A vida e a liberdade são o oposto da propriedade e quem escolheu satisfazer-se com esta última opção, permanece morto-vivo há muito tempo.
Os anarquistas não estão restritos a datas ou territórios, nem limitam suas causas. Não cumprem metas e etapas de programas. Os anarquistas não sossegam porque não aceitam ser dopados ou anestesiados; porque, em seu corpo, cada célula experimenta a vida: liberdade se experimenta por inteiro.
A revolta, diferente da reivindicação, não está restrita ao alcance de um objetivo, mas arde viva enquanto existe o desassossegado. As tropas de choque, a assistência social, a medicação e o tribunal jamais serão capazes de apagar o fogo de pessoas livres.
O revestimento racional que objetiva desqualificar a anarquia invariavelmente vem acompanhado de extermínio: foi assim após a Comuna de Paris (1871), seguida do julgamento dos 30, foi assim com aRevolução Espanhola (1936-1939), como foi no Brasil no começo do século XX, ou na Rússia, após a vitória dos bolchevistas. Ocorre que a decisão em não mais servir, de recusar o governo, faz de cada um o inimigo do Estado e da sociedade, alvo do corte que permite entregá-lo à morte: todo revoltado é tomado como um criminoso que ameaça a sociedade!
Em sua missão de conservação os defensores da ordem não recusam a violência, usam-na a seu favor e quando acusam os outros de violentos é pelo temor do fogo, princípio e fim da existência. O que temem nos anarquistas é sua maneira incendiária de existir.

3 comentários:

  1. Profunda reflexao de acertado posicionamento. Fico feliz que pessoas pensantes como voce vislumbram uma realidade possivel. Esta mesmo na hora de quebrarmos o Status Quo em que nos submetem os filtrantes no poder.
    Congratulaçoes
    Parabems
    Airton Costa
    airtoncrs@yahoo.com.br

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  2. Compartilhando do entendimento exposto no texto de que vivemos em uma sociedade formatada, onde todos buscam um espaço sobre o “muro”, escondendo se atrás do pseudo pluralismo, a fim de barganhar em beneficio próprio, estranha me a citação da política de Assistência Social como sendo instrumento utilizado para apagar o fogo das pessoas livres.
    O Serviço Social nasce, é verdade, junto com o capitalismo. Originário da burguesia, como forma de controle para manutenção da ordem que surgia ( séc.XVI), pós período feudal, assim com uma identidade atribuída, alienado, exercendo praticas alienantes (Maria Lúcia Martinelli, 2006). Este profissional e assim a assistência social são constituídos e constituintes da história, acompanhando a conjuntura social vivida.
    Os gritos de liberdade da classe trabalhadora nos anos 60, durante o período de ditadura militar no Brasil, iniciaram nesta profissão um movimento de reconceituação onde o Serviço Social assume sua posição junto à classe trabalhadora ao aproximar se da obra de Karl Marx, tendo na questão social seu objeto de trabalho. Inicia se assim a construção de uma política garantidora de direitos onde o usuário aparece como protagonista, onde os enfrentamentos as manifestações da questão social são buscados na própria demanda.
    A política de assistência social, defende se aqui, não difere de outras políticas, pois é implantada por profissionais pouco comprometidos com uma transformação de fato. Os reacionários egocêntricos estão em todas as profissões e políticas. São filósofos que distanciam se da população por não tolerar a “falta de conhecimento” teórico, são advogados alimentando se das manifestações da questão social, psicólogos que não enxergam absolutamente nada alem do individuo, sistematicamente procurando por patologias, Assistentes Sociais abrindo mão da categoria mediação colocando se ao lado do empregador etc.
    O serviço social, no entanto, a que pese toda história de contradições, trás em seus ensinamentos o de radicalização da democracia, e “ser radical é tomar as coisas pela raiz, e a raiz, para o homem, é o próprio homem”. (K. Marx). Esta radicalização da democracia esta presente na política Nacional de Assistência Social (2004), a que se considerar, no entanto, os 500, anos de barreiras criadas ao protagonismo, a través do coronelismo, paternalismo e clientelismo.
    O texto fala em pessoas livres sendo reprimidas por algumas políticas, não percebe se, no entanto, estas pessoas “livres” no cotidiano da Assistência Social encontra se sim prisioneiros do sistema e o sistema é o todo. O sistema cuida de aprisionar garantindo as ausências na vida das pessoas. Como é possível ser livre, se vivemos em um mundo complexo onde as tecnologias avançam dia a dia, sem o devido conhecimento? Como é possível sermos livres se dependemos de um sistema de saúde que nos impõe dias, horários, nos submetendo as esperas intermináveis, onde não temos vós, somos apenas doentes? Como é possível sermos livres se estudamos num sistema educacional que não nos compreende onde contraditóriamente ao que nos ensina Paulo Freire, somos vasilhas vazias?
    Onde esta a liberdade dentro desta lógica de acumulo capitalista?
    Não nos deixemos, no entanto, abater assumamos cada um sua parcela de responsabilidade, sigamos o que nos diz Guimarães Rosa; “ A gente tem que sair do sertão! Mas só se sai do sertão tomando conta dele a dentro...
    O sertão é o mundo, e o mundo ocidental hoje é capitalista, dele somos todos vitimas e fomentadores, beneficiados e excluídos, a visão de mundo de cada um é que pode mudar ou estimular esta lógica.
    Grande abraço!!!

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  3. aguardem respostas.
    abraços grandes!
    maria luiza

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