"Subtrair o único da multiplicidade a ser constituída; escrever a n-1. Tal sistema poderia ser chamado rizoma." (MP, 13).
"Diferentemente das árvores ou de suas raízes, o rizoma conecta um ponto qualquer com outro ponto qualquer, e cada um de seus traços não remete necessariamente a traços de mesma natureza, ele põe em jogo regimes de signos muito diferentes, inclusive estados de não-signos. O rizoma não se deixa reduzir nem ao Uno nem ao múltiplo... Ele não é feito de unidades, mas de dimensões, ou antes, de direções movediças. Não tem começo nem fim, mas sempre um meio, pelo qual ele cresce e transborda. Ele constitui multiplicidades" (MP, 31).
* Esse conceito, provavelmente o mais famoso de Deleuze e Guattari, nem sempre é bem compreendido. Por si só, é um manifesto: uma nova imagem do pensamento destinada a combater o privilégio secular da árvore que desfigura o ato de pensar e dele nos desvia (a introdução de Mil platôs, intitulada "Rizoma", foi publicada separadamente alguns anos antes do livro; a noção surge pela primeira vez no Kafka). É flagrante que "muitas pessoas têm uma árvore plantada na cabeça" (MP, 24): quer se trate de se buscar raízes ou ancestrais, de situar a chave de uma existência na infância mais remota, ou ainda destinar o pensamento ao culto da origem, do nascimento, do aparecer em geral. Genealogistas tradicionais, psicanalistas e fenomenólogos não são os amigos do rizoma. Além disso, o modelo arborescente submete, pelo menos idealmente, o pensamento a uma progressão de princípio a conseqüência, ora o conduzindo do geral ao particular, ora buscando fundá-lo, ancorá-lo para sempre num solo de verdade (mesmo as aplicações multimídia, de nossos dias, têm dificuldade para instaurar uma navegação transversal, limitando-se o mais das vezes ao vaivém entre um sumário e rubricas num beco sem saída). Essa crítica, em Deleuze, não exclui absolutamente a manutenção da distinção entre fato e direito, oriunda do questionamento crítico ou transcendental. Convém aqui redobrar a atenção: se o empirismo tradicional consiste em pensar "condições maiores que o condicionado", não é mais evidente assimilar o direito ao originário e o fato ao derivado. Mas a coisa pode ser formulada de outra maneira: a origem, ela própria afetada pela diferença e pelo múltiplo, perde seu caráter de a priori englobante, ao passo que o múltiplo se subtrai à influência do Uno (n-1) e torna-se o objeto de uma síntese imediata, dita "multiplicidade"; doravante ela designa o que é primordial na experiência "real" (que nunca é "em geral" ou simplesmente "possível"), por oposição aos conceitos da representação. O rizoma diz ao mesmo tempo: nada de ponto de origem ou de princípio primordial comandando todo o pensamento; portanto, nada de avanço significativo que não se faça por bifurcação, encontro imprevisível, reavaliação do conjunto a partir de um ângulo inédito (o que distingue o rizoma de lima simples comunicação em rede - "comunicar" não tem mais o mesmo sentido, ver UNIVOCIDADE DO SER); tampouco princípio de ordem ou de entrada privilegiada no percurso de uma multiplicidade (para estes dois últimos pontos, ver COMPLICAÇÃO e a definição acima: "Ele não é feito de unidades, mas de dimensões").
O rizoma é portanto um antimétodo que parece tudo autorizar - e de fato o autoriza, pois este é o seu rigor, do qual seus autores, sob o termo "sobriedade", enfatizam de bom grado, pensando nos alunos apressados, o caráter ascético (MP,13,125, 342, 425). Não julgar previamente qual caminho é bom para o pensamento, recorrer à experimentação, erigir a benevolência como princípio, considerar enfim o método uma muralha insuficiente contra o preconceito, uma vez que ele conserva pelo menos sua forma (verdades primeiras): uma nova definição do sério em filosofia, contra o burocratismo puritano do espírito acadêmico e seu "profissionalismo" frívolo. Essa nova vigilância filosófica é aliás um dos sentidos da fórmula: "condições não maiores que o condicionado" (o outro sentido é que a condição se diferencia com a experiência). O mínimo que se pode dizer é que não é fácil manter-se nesse ponto: sob essa relação, o rizoma é o método do antimétodo, e seus "princípios" constitutivos são regras de prudência a respeito de todo vestígio ou de toda reintrodução da árvore e do Uno no pensamento (MP, 13-24).
** O pensamento remete portanto à experimentação. Essa decisão comporta pelo menos três corolários: 1) pensar não é representar (não se busca uma adequação a uma suposta realidade objetiva, mas um efeito real que relance a vida e o pensamento, desloque o que está em jogo para eles, os relance mais longe e alhures); 2) não há começo real senão no meio, ali onde a palavra "gênese" readquire plenamente seu valor etimológico de "devir", sem relação com uma origem; 3) se todo encontro é "possível" no sentido em que não há razão para desqualificar a priori certos caminhos e não outros, todo encontro nem por isso é selecionado pela experiência (certas montagens, certos acoplamentos não produzem nem mudam nada). Aprofundemos este último ponto. Não nos iludiremos com o jogo aparentemente gratuito ao qual convida o método do rizoma, como se se tratasse de praticar cegamente qualquer colagem para obter arte ou filosofia, ou como se toda diferença fosse a priori fecunda, segundo uma doxa difundida. Decerto quem espera pensar deve consentir em uma parte de tateamento cego e sem apoio, em uma "aventura do involuntário" (OS, 116-9); e, apesar da aparência ou do discurso de nossos mestres, esse tato é a aptidão menos partilhada, pois sofremos de excesso de consciência e excesso de domínio - não consentimos de forma nenhuma no rizoma. A vigilância do pensamento nem por isso permanece menos requisitada, mas no próprio cerne da experimentação: além das regras mencionadas acima, ela consiste no discernimento do estéril (buracos negros, impasses) e do fecundo (linhas de fuga). É aí que pensar conquista ao mesmo tempo sua necessidade e sua efetividade, reconhecendo os signos que nos obrigam a pensar porque englobam o que ainda não pensamos. E eis por que Deleuze e Guattari podem dizer que o rizoma é questão de cartografia (MPP,19-21), isto é, de clínica ou de avaliação imanente. Acontece, sem dúvida, de o rizoma ser imitado, representado e não produzido, e servir de álibi a amálgamas sem efeito ou a logorréias fastidiosas: pois se acredita que basta que coisas não tenham relação entre si para que haja interesse em vinculá-las. Mas o rizoma é tão benevolente quanto seletivo: ele tem a crueldade do real, e só cresce onde efeitos determinados têm lugar.
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