cantei as mais soberbas canções,
dancei as mais estranhas danças que animaram meus ancestrais.
no embalo do porão dos navios em que cruzaram os mares,
balancei meu corpo lívido e frágil.
cantei, novamente e vi em meu canto,
um lastro de sangue se esvaindo de mim.
deixei que o sangue secasse e virasse tatuagem,
para lembrar, todos os dias, do fino fio da navalha que me cortara.
andei assim, possuída por entidades estranhas,
sussurrando nomes que me vagavam na memória,
lembrando cheiros colados em minha pele,
alucinando com corpos possuindo meu corpo.
olhava para o sol e gemia seu calor.
olhava para a lua e uivava um misto de dor e orgasmo.
olhava para a terra e só via as plantas nascidas de sementes malditas.
olhava para a água e só pensava salgá-la com lágrimas quentes.
olhava para o fogo e seu calor refletido em meu rosto, teimava em queimar meus pensamentos.
um dia estanquei, na encruzilhada entre o deserto e a vegetação rasteira que via logo ali.
não era miragem. Era verde. Verde-vivo.
descalcei meus pés e arranquei minha roupa suja e suada.
quando entrei no campo de chuva, deixei a água escorrer
e lavar o sangue-tatuagem e algo dentro de mim.
respirei aliviada.
naquele dia consegui andar.
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