domingo, 4 de abril de 2010

Meio meu, meio alheio

Estou recolhida ao meu canto, produzindo alguns documentos que me foram dados como condição obrigatória produzir e que, em vez de servirem para mudar a vida das gentes sobre as quais lhes traço as palavras, servirão apenas para alimentar a burocracia de uma dada instituição que pretende regular vidas. Então, pensando nisso, trago das poetagens de José Saramago, umas tecituras sobre as coisas que ousamos discutir e as coisas que tocamos tão pouco, que até ficam parecendo absolutas: "Que fazer? Da Literatura à ecologia, da fuga das galáxias ao efeito de estufa, do tratamento do lixo às congestões do tráfego, tudo se discute neste nosso mundo. Mas o sistema democrático, como se de um dado definitivamente adquirido se tratasse, intocável por natureza até à consumação dos séculos, esse não se discute. Ora, se não estou em erro, se não sou incapaz de somar dois e dois, então, entre tantas outras discussões necessárias ou indispensáveis, é urgente, antes que se nos torne demasiado tarde, promover um debate mundial sobre a democracia e as causas da sua decadência, sobre a intervenção dos cidadãos na vida política e social, sobre as relações entre os Estados e o poder económico e financeiro mundial, sobre aquilo que afirma e aquilo que nega a democracia, sobre o direito à felicidade e a uma existência digna, sobre as misérias e as esperanças da humanidade, ou, falando com menos retórica, dos simples seres humanos que a compõem, um por um e todos juntos. Não há pior engano do que o daquele que a si mesmo se engana. E assim é que estamos vivendo".

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