sábado, 12 de abril de 2014

flecheira.libertária.333

lâmina na merencória
No pátio do Museu da Cultura, espaço aberto no interior da PUC-SP, um anarquista expôs, na conversa “50 anos do golpe militar no Brasil”, a cumplicidade silenciosa da massa abúlica com o golpe civil-militar de 1964. Para além de escancarar as violências do Estado durante a ditadura, alertou ainda para a urgência em abolir as torturas no presente, em delegacias, prisões, Fundação CASA, pelas quebradas, vielas. Cortou o ar afirmando a vitalidade dos embates libertários contra o Estado e sua infindável produção de violências. Diante da presença de jovens estudantes, a lua brilhou sob o pátio do Museu da Cultura, lâmina na merencória. 
a pop star engajada da semana e os machos de plantão
No dia 27 de março, uma pesquisa do IPEA sobre violência contra a mulher, causou alvoroço por publicar dados que mostravam que 65% das pessoas achavam que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Logo uma jornalista começou uma campanha amplamente compartilhada nas redes sociais. Intitulada “eu não mereço ser estuprada”, a movimentação teve adesão imediata de diversas celebridades e inclusive da presidenta. Essa semana o IPEA lançou uma errata mostrando que o número real se referia a 26%, não 65%. A agitadora da campanha declarou que ficou “feliz” com o erro, afinal, segundo ela, a situação não é assim tão ruim. Para além da satisfação da pop-star engajada da semana, a mera existência de uma pessoa sequer que consinta com a violência sobre o corpo das mulheres já é inadmissível. A mentalidade de macho, ao contrário do que sustentou a campanha, não é uma questão estatística.
buraco negro? 
Para além desta merda, quase não se comentou a nota técnica Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde, publicada no mesmo dia, que mostrava que mais de 70% das violências sexuais acontecem contra crianças e jovens. Há vinte anos várias pesquisas confirmam essa porcentagem inalterada. Nada se diz sobre isso, mesmo porque os praticantes são na maioria os parentes. 
espionagem protocolar
No mês de confraternização dos 25 anos da rede, o criador da World Wide Web publicou no site da Fundação WWW um comunicado em favor da aprovação do Marco Civil da Internet no Brasil. O marco postula que as operadoras podem armazenar dados de usuários por um ano, e sites podem armazenar por seis meses. Os sites devem retirar qualquer conteúdo que a Justiça determinar, bem como ceder qualquer dado. Portanto, o controle sobre usuários permanece. Pouco se comenta que certa horizontalização da internet está apenas em seu acesso e que sua estrutura é altamente hierarquizada a partir de provedores nos EUA que centralizam a totalidade de dados. Agora o governo brasileiro terá acesso seletivo a eles. O novo acordo internacional de controle da espionagem da internet, defendido pelo Brasil após a polêmica da bisbilhotada de Obama nos emails de mandatários aqui e acolá, não visa espionar menos, mas fazer com que outros que não só os EUA possam espionar geral. Somado aos protocolos que regem a internet, mais protocolos são redigidos em nome do acesso e dos dados de cada usuário. Não há internet sem troca de dados, nem internet sem a expansão de monitoramentos. 
miséria up to date
Nas escolas de classe média pra cima de grandes cidades do Brasil, para além de tablets que vêm substituindo cadernos, já são bastante comuns também os aplicativos que permitem aos pais monitorar a vida de seus filhos através da ferramenta “dedo duro”. Também é possível que avaliem as notas de seus filhos diariamente, bem como atrasos, faltas e até mesmo se o transporte escolar trafega dentro da velocidade permitida. As agendas pessoais organizadas pela escola podem ser acompanhadas minuto a minuto, fortalecendo e compactuando uma relação entre pais e escola que produz medo e dá continuidade ao regime dos castigos. Fica clara a pressão cada vez maior exercida sobre crianças que, investidas de capital humano devem aprender, desde cedo, a obedecer e a calcular riscos. Repaginada por certa high tecnology, simultânea aos controles na escola, a obsessão por segurança torna a velhaca autoridade dos pais em conduta up to date, explicitando a miséria do nosso tempo. Não tardará chegar nas escolas de classe média pra baixo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário