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As crianças são temidas. Uma só palavra, um único gesto delas pode fazer desmoronar qualquer reino. Os adultos sabem muito bem disso e procuram calá-las, domesticar seus impulsos e aplicar sobre elas sua milenar cultura e educação por meio de ameaças e usos dos castigos, introjeção da crença em fantasmas, escolarizações e inibições de atitudes despojadas. Espera-se da criança que ela se transforme num bom cidadão, num bom trabalhador, numa boa pessoa, religiosa, filantrópica, tolerante, moderada. Espera-se que as crianças agora e no futuro colaborem para a conservação e aprimoramento de costumes. Todavia, são as crianças pobres que encarnam e escancaram o medode crianças em nossa sociedade. Elas são vistas como potencialmente perigosas, antes de mais nada, porque são pobres, por não possuírem uma família estruturada como a burguesa, não frequentarem regularmente escolas, não provarem para a sociedade que serão bons cidadãos e trabalhadores. Segundo o direito penal, por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, ela vive em situação de risco. Desde o Código de Menores de 1927 habita o vocabulário de juízes,promotores, advogados e pessoas preconceituosas como menor. É o outro, o estranho. É a criança perigosa que a sociedade não conseguiu calar e domesticar. Da mesma maneira, o conhecimento produzido pelas humanidades não consegue admirar a criança e suas surpreendentes atitudes. Prefere uniformizá-la e colabora para imobilizá-la por meio do conceito de infância, determinando quais são as condutas esperadas e adequadas, segundo uma classificação normalizadora. A criança é um perigo para a sociedade, uma leveza para a liberdade.
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