depois da queda!
A sondagem de um jornal paulistano indica que houve queda de reconhecimento popular ao movimento que avança por ruas e avenidas. A queda identificada não ofusca que mais de 60% da população é favorável a este movimento. A queda é irrelevante considerando haver algo insuportável que não se cala e permanece. A designação de vândalos parece não surtir os efeitos desejados pelos governos e mídias. A situação indica o que não é negociável para os jovens das ruas, seja a reivindicação de transporte gratuito, sejam os combates a edificações do capital, a conduta ou a existência da polícia.
pela culatra
No final da semana, passada nova manchete: um jovem foi preso e acusado de fazer parte de linchamento de coronel da polícia. Foi o efeito imprevisto da tecnologia da negociação feita missão de um coronel. Foi a expressão real da impulsividade alheia ao próprio movimento com suas diferenciadas forças. Foi a resultante do espelhamento da invariante conduta policial. É comum em qualquer movimentação concentrada que vários policiais ataquem violentamente um manifestante que por algum deslocamento diante deles ficou só. Somos regularmente informados disso por meio de fotos e vídeos em jornais, televisões e mídias alternativas. De certa maneira, a polícia viu contra si o resultado de seus covardes espancamentos regulares. Se na era das tolerâncias é intolerável a revanche contra um policial, também deveria ser inaceitável que policiais espancassem cidadãos em qualquer situação.
sem uniformes
É surpreendente como um abundante movimento diante de uma polícia numericamente inferior evita o massacre do oponente. Se não há reconhecimento da legitimidade da polícia, há o respeito pela vida e o corpo do policial assujeitado que defende o que lhe é exterior, a lucratividade de poucos. A polícia está confusa, os policiais cumprem ordens e as autoridades governamentais permanecem reativas, então, exigir uniformidade neste movimento é tentar reduzi-lo, equivocadamente, a uma identidade que não tem e nem pretende ter.
por onde passam os militantes da tática black bloc
Rio de Janeiro, UERJ, Colóquio Internacional Michel Foucault, semana passada. Zunzum repentino: corre informação que o black bloc fará uma intervenção no colóquio. Seguranças são acionados, alguns participantes ficam sobressaltados. É a última sessão de um concentrado e fino colóquio lotado de interessados nas exposições densas e intensas dos convidados pela sua organização. Inicia-se a sessão e jovens encapuzados adentram no recinto. Sente-se no ar certa tensão, afinal, eles são identificados e fichados como vândalos. Os participantes da mesa expõem suas reflexões em duas horas diante do silêncio atento da plateia e dos militantes. Nada ocorreu de extraordinário; ao final, somente a constatação de um medo infundado.
com as portas e as janelas abertas
Melhor para cada participante do evento. Melhor para os jovens irredutíveis que usam a tática black bloc. melhor para quemse dispõe, como o filósofo francês, em estar atento às forças que enunciam o insuportável. Na moderação neoliberal vigente, que coloniza a direita e a esquerda do Estado, nada melhor que conviver, ainda que brevemente, com rostos mascarados. Nada melhor que universidades de portas abertas. Que elas façam menos festinhas populistas e se abram, com seus professores, estudantes e funcionários para discutir o que é um rosto real sem lhes imputar a priori suas moralidades emboloradas!
por onde passam as interpretações?
As interpretações variam e todas mostram suas solicitudes. Nelas, os chamados de black bloc são do partido da violência, similares às torcidas uniformizadas, os que clamam pelo ausente Estado, os que escancaram a necessidade de limpar a política de políticos corruptos e desejosos de reeleição... Os black blocs são descritos em pesquisa empírica como jovens, classe média baixa, decepcionados com o Estado etc., etc. São interpretações que buscam uma aplicação da lei, qualquer lei, medidas de segurança, força policial, para que eles sejam condenados ou capturados para preencherem o chamado vácuo de poder. Sondagem mostra também que 95 entre 100 paulistanos são contra o black bloc. O futuro da tática dependerá destes e demais jovens que enunciam as forças e, dentre elas, a manifestação do insuportável.
uma diferença
Com os praticantes do black bloc não cabem definições apressadas. Nada indica serem o partido da violência (eles também são antipartidários) ou semelhanças com torcidas uniformizadas (muito mais próximas dos micro-fascismos). Neles pode haver uma oscilante contestação entre a regra da corrupção que sustenta a política, a seletividade do Estado, a crítica à propriedade e a antipolítica. Se há sempre infiltrados em qualquer movimento contestador, haverá também infiltrados em qualquer agrupamento de contestadores. É disso que vive a ordem para se atualizar. Assim como não é inesperado aparecer no meio da contestação e entre estes contestadores efeitos imprevisíveis e a insossa polêmica. Os jovens que aderiram à tática black bloc expuseram e expõem a dureza da propriedade que a democracia representativa e participativa não é capaz de absorver. Estes jovens falam uma linguagem que não é irredutível ao confronto e às meras palavras. Exigem mais diante do que não pode ser pacificado. Cabe aos intérpretes menos solicitude ou indiferença, mas tocarem desarmados nesta diferença.
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